São Paulo, terça-feira, 20 de junho de 1995
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Por trás das estatísticas

LUÍS NASSIF

A coluna recebe a seguinte correspondência, de leitores de Lençóis Paulista, que reflete de maneira objetiva o terrível paradoxo que se abateu sobre a economia, com a inexplicável política de crédito praticada pelo Banco Central (omito os nomes para não expor os leitores aos seus credores):
``Somos pequenos empresários. Durante os 20 anos de vida de nossa empresa, colaboramos para sua prosperidade com muito orgulho e coragem, buscando os benefícios gerados pelo crescimento para nós, nossos funcionários e para nosso país.
``Hoje não podemos mais nos orgulhar, pois pouco nos resta além de dívidas e do título de caloteiros. Investimos pesadamente numa modernização total que, nos últimos dois anos, permitiu índices de crescimento de 100% ao ano. Para 95, nossa previsão era de 120%.
``Hoje, vivemos um momento de decisão: vendemos toda nossa vida a preço de banana ou vamos até o fim para presenciarmos a destruição e a liquidação da única fonte de renda de nossa família?
``Do patrimônio familiar nada restou, pois tudo o que possuíamos foi vendido, tentando salvar a empresa. Hoje, pagamos aluguel e reduzimos nossos salários em mais de 60%.
``O que mais nos entristece é que temos excelentes perspectivas para 95/96. Temos uma empresa moderna, eficiente, com pessoal treinado e com excelente estruturação comercial. Atualmente, a demanda por nossos produtos é bem maior do que nossa capacidade total de produção. Além disso, no final de 1994 iniciamos uma venda contínua para uma montadora do ABC e hoje já produzimos 75% do que ela consome. Portanto, operacionalmente, nossa empresa é muito lucrativa. Mas os juros destroem esse lucro de maneira muito eficaz.
``Será necessário exterminar pessoas para acabar com a inflação? E o engraçado é que eles sempre têm uma desculpa para explicar as ondas de inadimplência, passando a idéia de um consumidor irresponsável e relaxado.
``Em nossa opinião, esse consumidor foi enganado, com o objetivo de eleger pessoas que hoje os apunhalam pelas costas. Pessoas honestas e com disposição para o trabalho são tachadas como caloteiras. Idiotas como nós, que acreditamos neste país, podem apenas arrepender-se, bater um `curriculum vitae' antes que venham buscar a máquina de escrever, e sair procurando emprego".
O depoimento é relevante para demonstrar o extraordinário estrago que essa política está impondo sobre a estrutura econômica do país. Não é apenas reduzindo o excesso de consumo. Está queimando todo o saldo do extraordinário movimento de modernização econômica ocorrido nos últimos anos.

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