São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Falência real

JANIO DE FREITAS

O aniversário do Real, cujos festejos não serão atingidos, como o é a saúde, por falta de dinheiro, atesta o êxito do combate à inflação, mas é também um atestado de fragilidade das instituições democráticas. A implantação e a permanência do Real foram feitas por 12 medidas provisórias, renovadas a cada 30 dias entre junho do ano passado e maio deste ano. Se a mais recente não for aprovada agora pelo Congresso, o presidente Fernando Henrique assinará a 13ª MP para manter a vigência do real.
Da mudança da moeda, um símbolo nacional, à vasta quantidade de regras sociais, econômicas e financeiras que alterou, a MP de lançamento do Real teve alcances que a distinguem de qualquer outra. Nem por isso os deputados e senadores dos partidos que dominam o Congresso se dispuseram a discuti-la e votá-la. Itamar Franco assinou a primeira MP e mais 6 renovações, Fernando Henrique já a renovou 5 vezes. O governo, no último semestre de Itamar e no primeiro de Fernando Henrique, não governou: reinou, com poder absoluto decorrente da omissão das maiorias da Câmara e do Senado.
Medida provisória tem efeito de lei, mas não é lei: sua validade é de 30 dias, findos os quais, se o Congresso não a aprovou nem rejeitou, pode ser reeditada. Tudo foi e continua sendo subvertido há um ano, portanto, sem que exista lei para tanto, mas tão só um recurso provisório e passível, ao menos teoricamente, de rejeição pelos congressistas.
Um ano não é decurso insignificante de tempo. É prazo mais do que bastante para ver-se que o Congresso abdicou de suas funções e, mais ainda, de suas responsabilidades. Deixou de ser 1 dos 3 Poderes que caracterizam o regime de instituições democráticas: é órgão apenas referendador das decisões do Executivo, é só uma versão caríssima do ``carimbador-adido" da velha piada.
A maior frequência de parlamentares na atual legislatura criou, por algum tempo, a impressão de que o Congresso estivesse mais ativo. Mas o aumento de presenças não se traduziu em aumento da atividade. Pelo contrário, tudo o que os parlamentares têm feito neste ano é votar umas poucas propostas de emendas constitucionais. A atividade propriamente legislativa inexiste.
O gesto de independência e altivez institucionais, que alguns vêem na ameaça de aprovação do teto de 12% anuais para os juros, é apenas aparente. A independência e a altivez reduzem-se, na maior parte dos apoios ao projeto, à atitude em causa própria: a quase totalidade dos parlamentares é constituída por possuidores de empreendimentos afetados pelos juros. E, assim como tem sido com os projetos originários do governo, o resultado final depende só da massa de cargos e favorecimentos lançados na negociação com os que fizeram do voto uma outra moeda real.
Já arruinado moralmente no conceito público, o Congresso se conduz para a falência institucional.
Os pés-frios
Tudo estava preparado, desde o presidente que se descobriu flamenguista até os que foram ao Maracanã para mostrar-se com o povão em festa (caso do líder do PSDB, José Aníbal, entre tantos outros). A vitória do Flamengo ia ser faturada pelo governo, à falta de motivos próprios para ser identificado, por uma vez que fosse, com os sentimentos populares.
Já se sabe quem azarou o Flamengo.

Texto Anterior: ONU deve combater a fome, diz presidente
Próximo Texto: Cai 2º homem da Educação, acusado de gastar demais
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.