São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 1995
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Só salário não vale

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Desindexar a economia é uma necessidade tão óbvia que até dispensaria comentários. Mas há uma outra necessidade, igualmente óbvia, que corre o sério risco de não ser contemplada pelo governo.
Trata-se de evitar que a desindexação se limite a extirpar a correção dos salários pela inflação passada, mantendo-se os demais indexadores.
Aí, a mensagem que vai passar para a sociedade, correta ou não, é a de que, mais uma vez, os salários pagaram o pato.
Não que desindexar salários seja ruim. Ao contrário. Se de fato o governo estabelecer a livre negociação, quem tende a ganhar, no médio prazo pelo menos, é exatamente o sindicalismo, desde que tenha competência para tanto.
Hoje, a reposição automática pela inflação, mesmo com todas as tungadas já havidas nesse capítulo, funciona como anestésico para o assalariado. Ele não precisa do sindicato para receber um reajuste correspondente à inflação verificada desde o reajuste anterior.
Sem tal anestésico, a força de cada categoria profissional estará diretamente vinculada à força de sua respectiva organização sindical, o que é bom para o movimento sindical e para a sociedade.
Livre negociação, aliás, é plataforma antiga do sindicalismo mais organizado, até porque se sabe que, sempre que o governo se mete no meio, a chance de o trabalhador ser beneficiado é menor do que se ele depender de suas próprias forças.
Por mais méritos que possa ter a livre negociação, ela vai acabar empalidecendo se a desindexação se limitar a extinguir o IPC-r como indexador salarial.
Pode até haver incontáveis explicações técnicas para que se faça a desindexação só dos salários. Mas nem todas elas nem a mais fantástica capacidade de comunicação do governo serão suficientes para evitar a impressão de que a corda, outra vez, arrebentou do lado mais fraco.
Vai-se voltar a uma discussão já havida no lançamento da URV. Na época, questionou-se o fato de os salários ficarem contidos e, os demais preços, livres. Agora, é contrário. Por que liberar só os salários?

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