São Paulo, quinta-feira, 29 de junho de 1995
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Oscar Peterson vence o tempo com jazz

LUÍS ANTÔNIO GIRON
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

O pianista canadense Oscar Peterson é um dos últimos grandes astros de jazz que ainda lotam qualquer teatro onde se apresentam. Talvez seja o derradeiro, e assim foi esperado pelo público que se apinhava diante do Carnegie Hall na noite de anteontem.
O espetáculo, parte da programação do JVC Festival, teve os ingressos esgotados com duas semanas de antecedência.
Aos 69 anos, contemporâneo de Sarah Vaughan, Miles Davis e Dizzy Gillespie, Peterson voltou à ativa há um mês, depois de correr risco de vida com um ataque no coração que sofreu em 1993.
``Acabo de fazer uma pequena turnê pela Europa", comentou, antes de iniciar o espetáculo. ``A excursão foi muito restrita, cinco cidades. Ordens do médico."
Peterson ironiza a própria condição e reage com uma inquietude singular para sua idade e os bem curtidos 50 anos de carreira. Acaba de lançar o CD ``The More I See You", recheado de composições próprias que remetem aos ``standards" da ``mainstream", mas, ao mesmo tempo, sugerem uma guinada ao clássico.
Algumas de suas peças lembram improvisos de Schubert pelo lirismo melódico. Claro que ele aplica a este as lições de seu mestre, o pianista Art Tatum, e deriva do romantismo às variações infinitas e digressivas do jazz.
Ele enfatizou esse aspecto híbrido no concerto de anteontem. Ao longo de duas horas, destilou o jazz mais rigoroso, acompanhado de um trio (contrabaixo, bateria e guitarra), cujo destaque foi o contrabaixista Niels Pedersen.
A platéia o recebeu em pé, por méritos passados. Ela teve motivos para repetir o gesto ao final. Pasmou-se com o virtuosismo digital do mito, intacto ao longo dos tempos, e a capacidade de renovar o repertório. Tocou quase que exclusivamente músicas do novo disco. A mais interessante é a lenta ``City Lights". Ela progride da ingenuidade ao atletismo bebop.
Deixou para o fim os ``standards" e as raridades de Tatum. Reergueu seu ``stride piano" (estilo ``martelante" dos anos 30), que havia ignorado nos anos 80.
Ao final, não quis comentar a reação histérica do público: ``Não tenho nada a ver com isso. Meu trabalho é apartado da recepção do público. O que me interessa é a música que se faz no palco".
Quer encher a agenda e aposentar o médico. Enche o peito e diz num ritmo de desaforo: ``Para azar da doença, eu estou de volta!"

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