São Paulo, sábado, 1 de julho de 1995
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Eficiência e deficiência

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Realizou-se, de 28 a 30 de junho, em Belo Horizonte, um seminário por uma política de atendimento a crianças e adolescentes portadores de deficiência mental, sensorial e/ou física. Essa iniciativa procura ser instrumento que articule e integre os setores governamentais e não-governamentais que atendem crianças e adolescentes com algum tipo de deficiência. O seminário permitiu também apresentar caminhos concretos para levar à frente os trabalhos, até hoje executados pela Febem, cuja extinção ficou determinada desde 31 de março pela lei 11.819/95.
No entanto o objetivo maior é de que se estabeleça uma política global de promoção dos direitos da população infanto-juvenil, conforme o ``Estatuto da Criança e do Adolescente". Esse seminário teve o mérito de reunir as várias forças da sociedade, convencidas de que o atendimento aos portadores de deficiência não pode depender de ações isoladas e desarticuladas, mas deve surgir da cooperação de todos: governo e sociedade civil.
A produção de um vídeo, feito com objetividade e respeito, mostrou com duro realismo a situação de alguns centros educacionais que abrigam crianças, adolescentes e adultos portadores de deficiência. A descrição desses ambientes não tinha por finalidade impressionar, mas suscitar o interesse e a cooperação de todos para transformar a qualidade do atendimento. Poucos funcionários -heróicos- sobrecarregados, inadequadamente remunerados. Falta de agasalho e de roupas para os internos. Carência no sistema de higiene e enfermagem. Noites longas, interrompidas por crises convulsivas, quedas e gritos. Ausência dos familiares. Esquecimento por parte da sociedade.
O importante é a nova política global. Em primeiro lugar, os pais precisam de apoio para acolherem e manterem, em seu lar, os portadores de deficiência. Na falta dos parentes, muito ajuda um ambiente familiar supletivo. Nos casos mais árduos, as instituições são necessárias, mas, nestes casos, devem ser a ``menina dos olhos" da sociedade, com equipes capacitadas, instrumentação moderna, locais agradáveis e recursos financeiros, substituindo, a curto prazo, as cenas tristes de seres humanos deitados pelo chão, isolados ou expostos a maus-tratos de companheiros, olhares perdidos, aguardando, durante anos, quem os venha visitar.
O seminário ofereceu propostas significativas para que sejam implementadas, com urgência, as determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente da Lei Orgânica de Assistência Social e da consequente atuação dos conselhos estaduais e municipais, previstos na lei.
Na expectativa de uma solução humanitária e competente, por parte de toda a sociedade, especialmente dos que sentem o apelo da fraternidade cristã, precisamos reconhecer e louvar os esforços surpreendentes das Apaes e dos educadores da Febem e outras entidades, que, durante anos, têm conseguido, sem medir sacrifícios, dar apoio às famílias dos portadores de deficiência, ensinando-as a amar ainda mais seus filhos e a cuidar deles de modo adequado. A presença entre nós de crianças que não ouvem, não vêem, não andam, não se comunicam revela um grande mistério. Dando a eles atenção e afeto, vamos saindo do nosso egoísmo e aprendendo a amar.
Que seria de nossa sociedade sem a eficiência dos deficientes?

D. Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.

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