São Paulo, domingo, 2 de julho de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Nocaute técnico
ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES Estamos ainda refletindo sobre os novos rumos do Plano Real. É um pouco cedo para se saber o que ocorrerá na realidade dos fatos. O próprio presidente Fernando Henrique alertou que o primeiro aniversário do Real deve ser marcado por um esforço redobrado para se chegar ao saneamento total da nossa economia.O Brasil fez grandes conquistas no primeiro ano do plano, sem dúvida. A inflação baixou. O poder de compra aumentou. Alguns monopólios importantes foram quebrados. A agricultura produziu comida barata. O povo percebeu as vantagens da estabilidade da moeda. Mas o Plano Real fez também os seus estragos. O mais grave foi a brutal elevação da taxa de juros para os que produzem, inclusive os agricultores. Nos últimos 12 meses, o Brasil viveu os velhos tempos de cassino, enriquecendo os especuladores e empobrecendo os produtores. O que se viu foi uma aguerrida luta de bastidores entre a produção e a especulação. No primeiro ``round", ficou claro que os produtores foram a nocaute técnico e os especuladores venceram. Inicia-se agora uma nova fase do Plano Real -uma nova luta. Já que o Poder Executivo resolveu criar a figura do mediador, está aí uma disputa importante para o próprio governo mediar. A sensibilidade do presidente da República dirá a ele, com certeza, que, na luta entre a produção e a especulação, o mediador natural é ele mesmo. Várias medidas importantes foram desenhadas para reduzir a força da especulação. As aplicações de curto prazo perderam atrativos. As de longo prazo foram estimuladas. A própria poupança popular foi induzida a durar mais tempo antes do saque. Tudo isso está na direção certa. Ocorre, porém, que, na prática, a teoria é outra. O governo terá de ficar muito atento às jogadas do dia-a-dia. Uma coisa é planejar a morte da especulação. Outra coisa é executá-la. Nunca foi tão importante para este país canalizar os recursos para o setor produtivo, em especial para a agricultura. É isso que enche as prateleiras, gera emprego e combate efetivamente a inflação. A inflação é uma doença traiçoeira. É como hipertensão. O doente tem de vigiá-la continuamente. À menor distração ou extravagância, a recaída é certa e a doença volta com força total -até com ódio. Nós só poderemos comemorar o fim da inflação quando, relaxados os atuais controles artificiais, os preços venham a se manter estáveis. Neste dia o capital voltará a sustentar os investimentos produtivos, e o governo deixará de ser um promotor da ciranda financeira. Iniciamos o segundo semestre sabendo que a caminhada é longa e a vigilância terá de ser constante. Nesse ínterim é fundamental que algum oxigênio seja injetado nos setores que respondem pelo abastecimento e pelos salários dos que ainda se mantêm empregados. Só dessa forma poderemos evitar um novo nocaute. Texto Anterior: Os azuis de Ticiano Próximo Texto: SERÁ SÓ SEMÂNTICA?; PIADA SEM GRAÇA; IDENTIDADE NACIONAL; DESPOUPANÇA Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |