São Paulo, sexta-feira, 7 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SBPC, cultura e Maranhão

JOSÉ SARNEY

O Brasil tem instituições verdadeiramente heróicas. Sobrevivem, apesar de todas as dificuldades. Tome-se o exemplo da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), que realiza no Maranhão a sua 47ª Reunião Anual e vai reunir cerca de 15 mil participantes e apreciar 2.357 trabalhos científicos.
Em Portugal, há 200 anos, foi fundada a Academia das Ciências de Lisboa, com o objetivo de ``vulgarizar" a cultura, mais do que difundi-la, torná-la um hábito. A SBPC, como a sua irmã portuguesa, manteve sempre a característica de não ser uma sociedade voltada para um grupo de sábios. Não, ela deseja democratizar os saberes, de modo que deles participe um universo cada vez maior.
Nosso país, infelizmente, tem colocado a ciência e a tecnologia fora de suas prioridades. Os recursos que estavam alocados em 1993 para o setor eram menores do que os de 1989. Esse fato é mais preocupante porque sabemos que, hoje, a ciência e a tecnologia são, talvez, mais importantes para o processo produtivo que os recursos naturais, os equipamentos industriais e a própria mão-de-obra. O cenário emergente do século 21 será marcado pelos países que dominam tecnologias e os países sem acesso ao saber, colonizados culturalmente.
O Brasil não pode ter o sonho de ser uma potência econômica se não for uma potência científica e culturalmente desenvolvida. Por outro lado, não podemos esperar a homogeneização de nossas estruturas sociais para enfrentar o desafio do progresso científico e tecnológico. Será, também, um erro separar a produção científica das condições sociais que presidem sua elaboração. O desenvolvimento econômico e tecnológico não pode ser exercido num vácuo social. Depende de uma série de fatores institucionais, econômicos e propriamente científicos. Cada vez mais, o sistema produtivo passou a depender de uma infra-estrutura de conhecimentos, que exige um esforço coletivo.
Os países de nosso nível vivem o drama de perseguir sistemas produtivos mais modernos e mais eficientes. Mas os países avançados criam dois impedimentos restritivos: o monopólio do saber e a tendência a cercear a difusão do conhecimento tecnológico. Acredito que o mundo do futuro será aquele em que os saberes não sejam comercializados, mas patrimônio da humanidade. Todo progresso científico nasce da bagagem de conhecimento acumulado, desde o homem das cavernas. O saber tem que ser universal, e, no dia em que isso acontecer, toda a inteligência humana junta poderá transformar nosso planeta. Não haverá mais barreiras para o saber nem lugar para o pessimismo, porque o homem estará apto a modificar os meios de produção, viajar às profundezas da lei da criação para descobertas de novas fontes de energia, criando amplas perspectivas para melhorar a vida.
Acredito que a grande transformação do mundo será feita pela ciência e a tecnologia. Foram elas que derrubaram as ideologias. Serão elas que recriarão uma nova ideologia, de um mundo solidário, sem desníveis regionais nem injustiças sociais. Para isso, é necessário colocar os saberes a serviço de toda a humanidade e não monopólio dos países ricos.
A SBPC, na sua reunião do Maranhão, vai fazer, sem dúvida, uma reflexão profunda sobre esses temas. A terra é fértil para esse tipo de debate, pois em São Luís não se erguem estátuas senão a poetas e homens de saber.

Texto Anterior: A fazenda dos animais
Próximo Texto: A ESTIBORDO; LEOA FERIDA; ESQUERDA ABSTRATA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.