São Paulo, domingo, 16 de julho de 1995 |
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Novela disfarça preconceito racial e agrada telespectadores
ARMANDO ANTENORE
Uma pesquisa patrocinada pela emissora há pouco mais de um mês revela que telespectadores do Rio e de São Paulo se identificam com os personagens negros da novela ``A Próxima Vítima". Identificar-se, no caso, não significa apenas gostar dos Noronha, a família negra de classe média que compõe um dos principais núcleos da trama. Significa também -e principalmente- que: 1) O público aponta como ``reais" as situações protagonizadas na novela das 20h30 por Cleber (Antonio Pitanga), Fátima (Zezé Motta), Sidney (Norton Nascimento), Jeferson (Lui Mendes) e Patrícia Noronha (Camila Pitanga). 2) Os telespectadores consideram ``positivo" que ``A Próxima Vítima" enfoque a família de maneira ``tão verossímil". Julgam, ainda, que tal abordagem é ``inédita" na televisão brasileira. E é mesmo -mas não pelo motivo que a pesquisa indica. Para as pessoas que participaram do levantamento, o fato de os Noronha pertencerem à classe média diferencia ``A Próxima Vítima" das demais novelas. Os pesquisados dizem que já estava na hora de a teledramaturgia nacional deixar de retratar o negro como pobre. A realidade é mais ampla, afirmam. E nem todas as famílias negras do país enfrentam problemas financeiros. Ocorre que, muito antes de ``A Próxima Vítima", outras novelas da Globo abriram espaço para personagens negros de classe média. Há 20 anos, o ator Milton Gonçalves viveu um psiquiatra em ``Pecado Capital", de Janete Clair. Mais recentemente, ``Corpo a Corpo" (1984/85), ``Mandala" (1987/88) e ``Pedra Sobre Pedra" (1992) mostraram negros ocupando posições sociais de destaque. A diferença é que, em ``A Próxima Vítima", reina a democracia racial. Tradicionalmente, os negros de classe média entram nas novelas da Globo para se confrontar com personagens brancos. Exemplo: em ``Pedra Sobre Pedra", que a emissora está reprisando às 14h10, o padre Otoniel (Antonio Pompeo) assume a paróquia de Resplendor e provoca a ira racista de Gioconda Pontes (Heloísa Mafalda). A beata, um tanto lunática, chama o pároco de ``coisa preta" e ``tição". Ofende-o com uma virulência que dificilmente os telespectadores presenciariam nas ruas. Em ``A Próxima Vítima", o autor Silvio de Abreu segue outro caminho, que considera mais adequado à realidade brasileira. À primeira vista, negros e brancos convivem harmoniosamente na novela. Nunca admitem rivalidades étnicas. Mas, de vez em quando, deixam escapar alguma conduta preconceituosa. São, em duas palavras, ``racistas cordiais". A mudança de tom interessa à Globo. O preconceito explícito das novelas anteriores costumava gerar protestos de artistas e militantes políticos. A grita não soaria nada bem agora -ano em que se festeja o terceiro centenário da morte de Zumbi, o mais importante líder negro do país. Texto Anterior: ``Telespectador não é brinquedo"; "`Malhação' é um fiasco" Próximo Texto: Cenas retratam ``racismo cordial" Índice |
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