São Paulo, segunda-feira, 17 de julho de 1995
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A rebelião dos incompetentes

MARCELO BERABA

SÃO PAULO - Cerca de 300 policiais civis amotinados conseguiram impedir, quarta-feira passada, o cumprimento de ordem judicial em São Paulo.
Durante 11 horas cercaram o presídio especial da Polícia Civil e não permitiram a remoção de 105 policiais presos. Derrotaram, no grito, a Justiça e o governo Covas.
Os policiais presos seriam transferidos porque dispunham, na prisão, de regalias como telefones celulares, visitas ilimitadas e saídas do presídio sem restrição.
Uma visita oficial constatou, em 23 de setembro de 94, que apenas 19 dos 80 presos condenados estavam no presídio. O resto estava na rua.
A Secretaria de Segurança prometeu, na própria quarta-feira da rebelião, punir os policiais sublevados. Até ontem tinha apenas aberto sindicâncias administrativas. Nenhum policial foi ao menos suspenso.
É provável que o governo estadual imagine que, ao tolerar a indisciplina e a improbidade, consiga controlar um corpo policial em crise. Não conseguirá.
Aliás, a protelação de soluções tem sido uma das marcas na Polícia Civil. Quando a imprensa mostrou a frequência e a gravidade das chacinas na Grande São Paulo, a secretaria criou uma coordenadoria para investigá-las.
Reportagem desta Folha no sábado mostrou que foi uma medida infrutífera, apenas para dar uma satisfação à imprensa e acomodar os protestos.
Foram cometidas este ano 32 chacinas na região, com 107 mortos e 24 sobreviventes feridos. Em apenas quatro casos todos os acusados pelos assassinatos foram presos. Difícil encontrar prova maior de ineficiência.
O combate ao crack -uma praga que se espalha pela periferia pobre de São Paulo como em nenhuma outra cidade brasileira- vai na mesma direção de medidas protelatórias e inúteis.
Esses policiais rebelados, que protegem bandidos condenados, se consideram acima da lei e da justiça. São, no entanto, apenas funcionários públicos incompetentes.
As estatísticas oficiais mostram que nunca se matou tanto nesta cidade como nos últimos meses.

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