São Paulo, quarta-feira, 19 de julho de 1995
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Rita Hayworth faz jus ao título do musical 'Bonita como Nunca"

SÉRGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

"Bonita Como Nunca" (You Were Never Lovelier) tem Fred Astaire, tem canções de Jerome Kern, mas sua maior dádiva é, mesmo, a moça à qual seu título se refere: Rita Hayworth (1918-1987). Ela, de fato, nunca esteve tão "lovelier (bela, adorável -mas não "amorosa", como traduzem nas legendas da canção-título). Nem em "Gilda" sua beleza foi tão radiosa e enfeitiçante. Impossível tirar os olhos de sua imantadora figura, absoluta em cena mesmo quando a seu lado Fred Astaire (1899-1987) conduz o "pas-de-deux".
Impecavelmente vestida por Jean Louis, Rita, no esplendor dos seus 24 anos, é uma deusa comparável à Terpsicore, a musa da dança que pouco depois encarnaria em "Quando os Deuses Amam". Sua personagem, Maria Acuña, filha de um magnata da hotelaria argentino, talvez tenha sido uma das mais bobas de sua carreira, mas esse detalhe não tem a menor importância. Quando o filme começa (na mesma cidade onde Gilda vivia pondo a culpa em Mame, rapazes), Fred Astaire (vulgo Robert Davis, dançarino desempregado) acaba de perder mais uma aposta no hipódromo de Palermo e o hoteleiro Eduardo Acuña (Adolphe Menjou) de casar a primeira de suas quatro filhas. Pela ordem imposta pelo patriarca, a próxima a segurar o buquê de noiva será Maria. Só depois chegará a vez das duas irmãs mais novas, aflitíssimas, com pretendentes na fila, e um obstáculo de difícil remoção: Maria, além de não ter namorado, parece pouco inclinada a conseguir um.
"Ela é fria como uma geladeira", comenta Robert ao conhecê-la. Com o tempo, mudará de opinião. Com o tempo, também, irá dobrar a caturrice do pai dela, obtendo a vaga de dançarino do Rainbow Room do Hotel Acuña (principal atração: a orquestra de Xavier Cugat) e, façanha mais espinhosa, a mão de Maria.
Produto típico da Política de Boa Vizinhança, "Bonita Como Nunca" é uma comédia romântica, descaradamente escapista, que poderia ter como cenário qualquer outra capital latino-americana. Dá para notar que Buenos Aires foi uma escolha de última hora, decidida com o filme já rodado, pois em nenhum momento seus personagens a mencionam pelo nome nem se referem à Argentina, preferindo o genérico "South
America" (América do Sul). Pelo visto, só Orson Welles levou a sério o empenho de Roosevelt em ser simpático com os americanos do sul.
Na primeira vez em que Fred e Rita dançaram juntos, em "Ao Compasso do Amor" (You'll Never Get Rich), as canções eram de Cole Porter e o diretor, Sidney Lanfield, tão burocrático quanto William A. Seiter. O desempate, em princípio, se daria no repertório musical, entregue, em "Bonita Como Nunca", a dois gênios do mesmo naipe de Porter: Jerome Kern (música) e Johnny Mercer (letra). Para mim, Porter ganhou.
Este pode ser, como muitos acreditam, o melhor musical de Kern desde "Ritmo Louco" (Swing Time, 1936) -"Showboat", feito para o teatro, não conta-, mas não me enche tanto os olhos (salvo por Rita) nem os ouvidos. Seus quatro números de maior destaque: "I'm Old-Fashioned", "You Were Never Lovelier", "The Shorty George" e "Dearly Beloved" (por incrível que pareça, a única que chegou ao Hit Parade da época). Rita não canta com sua própria voz. Foi dublada por Nan Wynn. Isso também não tem a menor importância.

Filme: Bonita como Nunca
Direção: William A. Seiter
Distribuição: LK-Tel (tel. 825-5766)

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