São Paulo, quinta-feira, 27 de julho de 1995
Próximo Texto | Índice

Indecência

Indecência. Perversão. Irresponsabilidade. Ou talvez ignorância. Incompetência, técnica ou política.
O México, superada a fase mais dramática de sua crise e evidenciado o processo de recuperação das suas reservas internacionais, reduziu os juros internos. A Argentina, consciente de que recessão e queda na arrecadação andam de mãos dadas, tratou de fazer seu ajuste fiscal. Cumpriu as metas acordadas com o FMI e já recebe recursos de organismos multilaterais. Noutros países, onde também há problemas, como os EUA, os juros caem quando se confirmam os sinais de desaquecimento econômico.
No Brasil, não. Não há dinheiro para nada, mas há todo o dinheiro do mundo para manter ágeis e lubrificadas as engrenagens da ciranda financeira. Os juros caem lá fora, aqui, as reservas internacionais se recuperam e já superam o nível vigente antes da crise do México, os sinais de desaquecimento econômico são inegáveis, nos vizinhos latino-americanos a luz vermelha já passa a, no mínimo, amarela. Nada, no mundo dos países emergentes, dos países centrais ou da realidade brasileira parece suficiente para sensibilizar as autoridades nacionais. O presidente da República insiste, o presidente do Banco Central reafirma e os ministros da área econômica reforçam até a exaustão que as taxas de juros estão altas e assim ficarão por muito tempo.
O consumo está caindo, as reservas estão em nível adequado, para dizer o mínimo. As entradas de capitais em julho beiram os limites do orgiástico. Uma orgia à custa dos cofres públicos, da saúde financeira das empresas e da promessa, cada vez mais retórica, de um ajuste econômico atento às condições sociais.
Ou as autoridades não acreditam mais nos vários argumentos que ofereceram nos últimos meses para sustentar juros elevados ou, o que é pior, há intenções nada transparentes na política obsessiva de atrair recursos externos no curto prazo.
Seja qual for o caso, manter onde estão essas taxas de juros escorchantes é uma indecência, uma irresponsabilidade, um despudor.

Próximo Texto: Hipócrates ou hipócritas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.