São Paulo, sexta-feira, 11 de agosto de 1995 |
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Morte do ídolo enterra a contracultura EDUARDO SIMANTOB EDUARDO SIMANTOB; MARCELO REZENDE
O coração do velho hippie não aguentou. Jerry Garcia não morreu por uma vida de drogas, mas devido à droga da vida. Para milhares de admiradores, Jerry era simplesmente um semideus. Semi, pois dava o ar de sua graça aos mortais, sem batalhões de fotógrafos, seguranças, assessores, multitécnicos. Um anti-Mick Jagger. Ao contrário do que as capas dos discos, as insígnias da banda, e o visual dos músicos pudessem sugerir -caveiras, motocicletas Harley-Davidsons, longas barbas, cabelos e muita droga-, suas músicas perdem de longe em decibéis para a maioria das bandas de rock. O Grateful Dead oferecia a seus fiéis seguidores (os ``deadheads", literalmente ``cabeças mortas") verdadeiros mantras para conduzi-los em suas viagens alucinógenas (LSD, mescalina, maconha são parte de um menu obrigatório nos shows da banda). A história começa numa comunidade localizada próxima à esquina das ruas Haight e Ashbury, em San Francisco, EUA. Esta esquina, emblemática do auge da contracultura e apelidada carinhosamente de ``Hashbury", era a primeira fronteira entre o Estado Hippie e o resto do mundo. A rua termina no parque Golden Gate, refúgio dos hippies que para lá se dirigiam para curtir suas viagens próximos à natureza. Pois era lá, geralmente em manhãs de sol, que Jerry dava o ar de sua graça. Como se dissesse ``hoje acordei feliz, peguei minha guitarra e fui tirar um som no parque". Jerry Garcia e o Grateful Dead simbolizavam o desejo de ruptura, cultural e comportamental, sofrida pela sociedade americana nas últimas quatro décadas. Não por acaso, o diretor italiano Michelangelo Antonioni utilizou canções de Garcia no mais americano de seus filmes: ``Zabriskie Point"', de 1968. Uma leitura do marxismo estudantil e do ideal revolucionário pela via psicodélica. Companheiros de todos os ícones daqueles anos (Jimi Hendrix, Janis Joplin, Timothy Leary etc.), filhotes diletos dos escritores Jack Kerouac e Allen Ginsberg, o Grateful Dead não assinou, em seus altos e baixos, o fim da utopia libertária com a mudança dos tempos, o avanço do neoliberalismo e do politicamente correto. É claro que não se pode dizer que fossem revolucionários. Pelo contrário, viraram uma espécie de monumento nacional. Na verdade, o tempo dos Dead e de Garcia já havia terminado. Mas, ao contrário de Elvis Presley, Jerry não morreu de overdose de si mesmo. Texto Anterior: Dead unia rock e psicodelia Próximo Texto: Guerreiro cultiva perseverança Índice |
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