São Paulo, quarta-feira, 23 de agosto de 1995
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A lógica animal

CLÓVIS ROSSI

Odeio não resistir à tentação de fazer sociologia de botequim, mas a batalha do Pacaembu, no domingo, ainda pede algumas perguntas (respostas ficam para quem entende do assunto).
É verdade que, na sua coluna de ontem, Matinas Suzuki Jr. deu uma porção de respostas. Mas ainda me ficou a sensação de que falta refletir sobre um dado. Parece-me que a violência gratuita é tão parte do chamado mundo moderno quanto o estresse, a onipresença do computador, a globalização da economia e roupas baratas feitas na China.
Suspeito que a explicação para tal violência esteja, além de todos os fatores já lembrados, no fato de que o ser humano foi lançado a um excesso de competição. Competitividade é a palavra da moda, vale para tudo.
Competir até que é saudável. Revigora os músculos ou o cérebro ou ambos. Dá uma sensação agradável quando se ganha ou se acha que ganhou. Mesmo na derrota, ainda é possível sentir estímulo para aperfeiçoar-se mais e vencer na próxima.
O diabo é que o mundo moderno criou dois problemas:
1 - Não estaria o ritmo de competição tornando-se excessivo? Compete-se no emprego, no trânsito, no esporte, no videogame (quase sempre em torno de enredos de violência), na escola, no vestibular. Está havendo espaço suficiente, entre uma competição e outra, para relaxar e gozar?
Ou se está esticando o ser humano além do limite que ele é capaz de processar?
2 - A uma parte da sociedade (no Brasil, uma parte muito grande) nega-se o instrumental para competir. Da compaixão pelo menos capacitado passou-se ao desprezo, à marginalização.
Para simplificar, ou o sujeito tem um computador e sabe usá-lo ou está condenado a ser um perdedor na competição pela vida.
Parece lógico que uma parcela dos condenados decida resolver tudo no braço. Aí, não precisa de instrumental algum. Funciona apenas o mais primitivo instinto, de que todos são dotados. É animal, não no sentido figurado. Mas tem sua lógica.

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