São Paulo, quinta-feira, 24 de agosto de 1995
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A dívida externa do Banco Econômico

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Entre os muitos pontos ainda obscuros da crise provocada pelo colapso do Banco Econômico, há pelo menos um que ainda não tem recebido o destaque merecido. Refiro-me ao tratamento dispensado aos credores externos do banco baiano.
Nesse ponto, como em tantos outros, a posição do governo federal tem sido vacilante. Ao ministro José Serra, por exemplo, atribuiu-se a declaração (não desmentida) de que seria ``fundamental" assumir todos os compromissos internacionais do banco ``para que a situação dos bancos (brasileiros) que operam no exterior se mantenha calma".
Já o presidente do Banco Central teria declarado que nem todas as obrigações externas seriam honradas, alegando que muitas delas corresponderiam a recursos desviados para o exterior por acionistas controladores do Econômico.
Que seja do meu conhecimento, em nenhum momento o governo colocou com clareza a posição que seria legítima e compatível com o interesse nacional: o compromisso de não fazer nenhuma discriminação a favor do credor estrangeiro.
Trata-se, em outras palavras, de aplicar ao caso do banco baiano o princípio da isonomia, colocando o credor nacional em posição de igualdade em relação ao estrangeiro.
É falacioso o argumento de que o governo deve honrar toda e qualquer obrigação externa de um banco privado quebrado, mesmo quando não garantida pela União, em nome da preservação do acesso dos demais bancos brasileiros ao mercado financeiro externo. A valer esse argumento, não deveria o governo honrar também todas as obrigações internas do Econômico, para não tumultuar a captação doméstica de outros bancos?
Uma solução que implique privilégios para os credores externos ``vis-à-vis" dos internos resultará em incentivo à transferência de recursos para o exterior. Se, em caso de crise, o governo brasileiro sempre preserva o interesse dos credores externos, todo brasileiro que tiver condições de fazê-lo preferirá aplicar no exterior e aproveitar-se dos diversos mecanismos pelos quais dinheiro de brasileiros retorna ao Brasil como se investimento externo fosse.
É evidente que isso não interessa ao país e nem ao sistema financeiro nacional. Os credores estrangeiros precisam acostumar-se a correr risco de crédito quando realizam negócios com o Brasil. Reforçar a tradição, que remonta aos anos 70, de que a União assume todas as dívidas externas de bancos privados insolventes estimula comportamentos imprudentes por parte de emprestadores internacionais e acaba contribuindo para desestabilizar, de forma recorrente, as relações do país com os mercados financeiros internacionais.
Qualquer discriminação contra o credor brasileiro será vista como odiosa e poderá ser questionada judicialmente.
Para ilustrar esse ponto, basta mencionar um caso relatado pelo interventor do Banco Central. Um depositante enviou-lhe, na semana passada, uma carta implorando que liberasse seu depósito, já que estava lutando contra um câncer e precisava do dinheiro para pagar uma cirurgia. ``Como técnico", comentou o interventor, ``teria que responder que, infelizmente, só poderia liberar os R$ 5.000".
Como explicar ``tecnicamente" a esse e tantos outros depositantes que, enquanto os seus recursos estarão bloqueados, o Banco Central usará recursos públicos para honrar obrigações externas do Econômico?

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