São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A farsa violenta

JANIO DE FREITAS

O governo quer carta branca para praticar, quando deseje, a violenta ilegalidade de redução dos salários em geral. Esse é o significado claro das palavras de José Serra e Pedro Malan quando, apresentando o projeto de ``reforma tributária", explicaram a proposta de ``um empréstimo compulsório para deter o consumo". Ou seja, para reduzir o poder de compra que é, para os assalariados, o próprio salário, irredutível por lei.
Se o Congresso não estivesse funcionando à maneira de uma dependência do governo, submissa aos ministros e ao presidente da República, teria muito o que fazer para limpar de absurdos como o compulsório e dar alguma qualidade e utilidade aos projetos governamentais de reforma administrativa e tributária. Nenhum dos dois é reforma e, ainda por cima, quando não mantêm os problemas atuais é porque estão criando novos.
Só se pode entender como reforma tributária um conjunto de medidas que dêem maior racionalidade ao sistema de impostos, distribuam a contribuição de maneira mais justa, assegurem arrecadação correspondente às necessidades da administração pública e reduzam as possibilidades de sonegação. Vejamos, porém, o que o governo diz, por palavras e atos, sobre o projeto de ``reforma" tributária que mandou ao Congresso.
Os gastos do governo ``em 96 terão que sofrer um corte de R$ 4 bilhões se o Congresso não aprovar a prorrogação do Fundo Social de Emergência" para vigorar ``até o final de 1999. A afirmação foi feita ontem (quarta-feira) pelo ministro José Serra". Os trechos entre aspas são da Folha de ontem, reproduzindo a defesa de Serra ao pedido de prorrogação, simultâneo ao envio do projeto de reforma tributária.
Mas que reforma tributária é esta que não se conjuga com as necessidades do governo, tornando necessária a prorrogação de um expediente de emergência justificado, quando de sua criação, há dois anos, pela impossibilidade de fazer então uma reforma tributária?
Sobre o próprio Fundo Social de Emergência não é preciso dizer mais do que disse o próprio José Serra no começo da semana, em Recife: ``Não é fundo, não é de emergência e não é social". É uma tapeação, portanto. Dupla: tapeação em si mesma e tapeação como reforço de arrecadação, que daria ares de reforma tributária ao que não é, porque o governo continuará precisando da solução improvisada que é o FSE.
O projeto de ``reforma" tributária do governo é uma fraude. Para demonstrá-lo, bastaria comparar sua falta de sentido, em termos de arrecadação, com palavras de Fernando Henrique na entrevista coletiva de terça-feira: ``O Imposto de Renda das pessoas jurídicas (isto é, empresas) caiu, apesar do aumento de alíquotas. De 4 milhões de empresas, só 750 mil recolhem Imposto de Renda. Pagam em média menos de R$ 700 reais por empresa". A média do Imposto de Renda por empresa é menor do que o imposto descontado dos salários de seus empregados.
E, no entanto, essa indecência tributária não entrou nas cogitações do projeto de ``reforma" mandado pelo governo ao Congresso. Nada surpreendente a omissão, entre tantas outras, sabendo-se que o projeto de taxação mais justa das grandes fortunas, apresentado por Fernando Henrique quando senador, não se transformou em lei porque vetado por Fernando Henrique presidente.
(O projeto de ``reforma" administrativa fica para depois).

Basta o receio
A força da oratória de Antônio Carlos Magalhães não está nos discursos: está no aviso de que vai fazer um discurso. É o que fica evidente de mais uma corrida do presidente Fernando Henrique para amansá-lo. Desta vez com um recado urgente, sobre ``a iminência de um bom acordo em torno no Econômico", quando o senador ia sair do gabinete para o prometido discurso no plenário. Marco Maciel e Jorge Bornhausen chegaram em tempo de permitir a Antônio Carlos a inversão do discurso, anteontem.
O poder da oratória baiana fez fama no passado. Agora tem poder sem fama e sem existir.

Texto Anterior: Legião brasileira parte para missão de paz em Angola
Próximo Texto: ACM confirma possuir ações do Econômico nas Ilhas Cayman
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.