São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 1995
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Deterioração

A popularidade do governo Fernando Henrique Cardoso dá sinais de estar se deteriorando mais rapidamente do que se poderia imaginar, às vésperas de completar apenas oito meses como ocupante do Palácio do Planalto.
A manifestação de ontem em São Bernardo do Campo é a demonstração mais visível e, talvez, a de maior espetacularidade, mas está longe de ser a única.
Seja qual for o número que se queira adotar como correto para os manifestantes de São Bernardo, o fato é que, há poucos meses atrás, manifestação alguma contra o governo ou contra o Plano Real teria chances de reunir mais do que os ativistas de sempre.
Ontem, já não foi assim. Que o primeiro sinal público de deterioração venha de São Bernardo do Campo é compreensível, duplamente compreensível aliás. De um lado, trata-se do berço do movimento sindical mais organizado do país, com uma tradição de atos do gênero talvez incomparável. De outro lado, são as montadoras de automóveis, concentradas majoritariamente no ABCD paulista, que estão anunciando demissões em grande número, até porque figuram entre os maiores geradores de empregos diretos e indiretos do país.
Quando empregam, empregam muita gente. Quando dispensam, porém, também dispensam em massa, o que faz mais ruído do que as demissões em vários outros setores de menor abrangência da atividade econômica.
Mas o ruído da rua, ouvido em São Bernardo, não é por certo o único. No ambiente empresarial, com uma ou outra exceção, as queixas também são mais e mais audíveis, ainda que, por tradição, o empresariado prefira resmungar nos escritórios a sair às ruas.
Antes, já houvera um protesto significativo contra o Plano Real, o chamado ``caminhonaço" dos agricultores em direção a Brasília. Mas, então, podia-se dizer que se tratava de uma questão setorial, ainda que estivesse contaminando também o comércio das regiões eminentemente agrícolas.
Agora, a queda no nível de atividade é tão disseminada que não dá mais para escudar-se sob o rótulo de questões setoriais.
O governo demorou demais para tentar ajustar a sintonia fina. É verdade que precisava conter o consumo para evitar um eventual repique inflacionário, mas há meses que se vem dizendo que a dose estava sendo exagerada.
Agora, a equipe econômica começa a desbloquear os mecanismos creditícios para o consumidor, o que só terá efeito a médio prazo.
Resta saber se outras são bernardos não surgirão no caminho até esse médio prazo, minando ainda mais a popularidade do presidente e do plano por ele montado.

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