São Paulo, domingo, 27 de agosto de 1995
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Inteligência britânica ataca estratégia antiorganizadas

OTÁVIO DIAS
DE LONDRES

No Reino Unido, a violência no futebol é assunto para ser tratado com inteligência. Desde 1989, uma unidade no Serviço Nacional de Inteligência Criminal enfrenta os famosos ``hooligans".
Para o detetive Bryan Drew, inspetor-chefe da unidade, proibir a entrada de torcidas organizadas nos estádios não é uma boa maneira de combater a violência.
Pelo contrário. Segundo ele, quanto mais organizadas as torcidas, mais fácil fica controlá-las.
A idéia de extinguir as uniformizadas é a espinha dorsal da estratégia da Federação Paulista de Futebol para conter o vandalismo.
Em entrevista à Folha, ele explicou como a violência no futebol é combatida na Grã-Bretanha.

Folha - Quando e por que foi criada a unidade de futebol na Inteligência Criminal?
Brian Drew - Foi criada em 1989 e passou a integrar o Serviço de Inteligência em 1992. Nossa função é coletar informações sobre a atividade dos ``hooligans", analisá-las e disseminá-las para a polícia na Grã-Bretanha e em outros países, de forma que as ações dessas pessoas possam ser frustradas.
Folha - Como a unidade é organizada?
Drew - Temos 10 oficiais no escritório central e 92 agentes espalhados pelo país, 1 para cada clube profissional. Esses agentes enviam as informações, o que nos dá uma perspectiva nacional sobre as atividades dos ``hooligans".
Durante o campeonato, há cerca de 92 partidas em todo o país por semana. Tentamos fazer com que a polícia de cada cidade saiba tudo o que é preciso saber sobre as torcidas que vêm de outras cidades. Quantos são, como, quando e onde vão chegar, onde se encontrarão, onde vão beber, a que horas chegarão nos estádios, quais são os torcedores mais perigosos.
Com essas informações, a polícia pode usar seus recursos de maneira inteligente e prevenir os atos de violência, em vez de só reagir a eles quando já estão acontecendo.
Folha - A unidade tem pessoas infiltradas nas torcidas?
Drew - Você pergunta se nós temos informantes? Isso é parte dos serviços de inteligência em qualquer país do mundo.
Folha - Isso levou a uma redução significativa da violência?
Drew - Uma série de fatores levou à diminuição da violência, entre eles a instalação de circuitos fechados de televisão nos estádios e a contratação de seguranças mais bem treinados pelos clubes.
Também foi proibida a venda de álcool nos campos e a entrada de torcedores embriagados. Hoje, se um torcedor invade o campo ou atira algo, pode ser condenado pela Justiça e ser banido dos campos.
Folha - Quantos torcedores já foram banidos?
Drew - Entre 400 e 600 pessoas, hoje. Elas são afastadas por no mínimo três meses. Mas há torcedores banidos por até 15 anos.
É possível impedir que torcedores violentos entrem nos estádios, mas não dá para evitar que viajem com suas torcidas pelo país. A maior parte dos atos de violência agora acontece fora dos campos.
Folha - No Brasil, uma das propostas para diminuir a violência é proibir a entrada de torcidas organizadas nos campos. Isso pode funcionar?
Drew - Acho que não. As torcidas se dividiriam em pequenos grupos e, na primeira oportunidade, se juntariam de novo dentro dos estádios. É melhor ter grupos bem organizados, de maneira que você possa controlá-los.
Além disso, nem todas as torcidas são formadas por ``hooligans". Muitas vão aos campos para se divertir. O futebol é um esporte emocional e pode haver brigas isoladas. Não é esse tipo de incidente que caracteriza um ``hooligan".
Os ``hooligans" são torcedores que cometem crimes com regularidade, que viajam pelo país ou para o exterior especialmente para organizar atos de violência.
Folha - Outra idéia que está sendo considerada no Brasil é de aumentar o preço dos ingressos.
Drew - Isso pode aumentar a violência fora dos estádios. As pessoas não poderão entrar e criarão problemas em outros lugares. Essa idéia parte do pressuposto de que os torcedores violentos são sempre os mais pobres. Na Grã-Bretanha, isso não é verdade.

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