São Paulo, quarta-feira, 30 de agosto de 1995
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A reforma fiscal do governo

LUÍS NASSIF

A reforma fiscal proposta pelo governo é federativa (não confundir com federal). Isto é, visa fortalecer o papel de Estados e municípios no sistema de arrecadação. De outro lado, visa permitir a montagem de um sistema fiscal homogêneo entre Estados, sob a tutela da União, para facilitar a formação de blocos econômicos.
A opinião é do principal formulador do projeto, economista Fernando Rezende, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
A idéia geral, já veiculada pela imprensa, é fundir os impostos federais, de maneira a ter dois impostos básicos sobre a produção: o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) estadual e o ICMS federal.
Rezende vê vantagens no modelo.
A primeira, a de caminhar gradativamente para a cobrança do imposto no destino, seguindo tendência mundial. Esse modelo facilitará a implantação de políticas fiscais modernas, como a desoneração das exportações e dos investimentos em bens de capital. Em impostos em cascata, tais políticas seriam de aplicação complexa e sujeitas a questionamentos internacionais.
A segunda vantagem é a da descomplicação tributária. As empresas terão que manter apenas uma escritura, uma só legislação e um só livro fiscal -e pagar duas vezes. Hoje em dia, uma empresa que tenha vendas nacionais tem que se submeter a uma legislação diferente para cada Estado, além da legislação federal.
A descomplicação significa que as alíquotas de tributos serão únicas e nacionais. Todos os Estados terão de se submeter à mesma legislação e às mesmas alíquotas, que serão aprovadas pelo Senado -por excelência, a casa que legisla sobre a Federação.

Dupla fiscalização
Qual a vantagem de manter duas estruturas simultâneas de fiscalização sobre um mesmo tributo? Entende-se analisando mais de perto a estrutura do novo tributo. Não será um tributo cobrado do varejo, como o modelo norte-americano -impossível de ser fiscalizado, dentro do modelo brasileiro.
Será o mesmo ICMS sobre valor adicionado que existe hoje. Isto é, paga-se o imposto em cada etapa de produção e compensa-se com o imposto que foi pago na etapa anterior.
Rezende é defensor incondicional desse modelo, que cria uma cadeia de solidariedade tributária, permitindo processos de auto-regulação: não interessa a um comprador comprar do fornecedor sem nota, pois não poderá se habilitar ao crédito tributário.
Mas a implantação de um sistema de tributação no destino traria inúmeros problemas de confiabilidade dos dados. Um produto fabricado em determinado Estado seria tributado em todas as etapas de produção. Depois, o comprador final precisaria receber os créditos de ICMS já pagos no processo de produção, para poder compensar com o imposto devido na ponta. Quem pode garantir que não haveria maquiagem de dados entre Estados?
Ao entrar na operação, o governo federal torna-se o grande avalista da integridade dos dados, além de atacar diretamente um dos maiores fatores de evasão de receita, que é a tributação interestadual.
Rezende estima que não deverá haver perdas líquidas para Estados -o que pode ser excesso de sonhos. O Nordeste ganha seguramente, já que é importador líquido de produtos. E exportadores líquidos, como São Paulo? Hoje em dia, o grande problema paulista é a sonegação interfronteiras, que seria minimizada com esse novo modelo.
Em suma, há uma boa discussão pela frente, mas em cima de um projeto que faz lógica.

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