São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995
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Os subversivos

JANIO DE FREITAS

A descoberta de um dispositivo de escuta clandestina na Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura, em Brasília, requer do governo providências mais concretas e enérgicas do que a simples entrega do caso à polícia do Distrito Federal. O problema vai muito além da Contag.
Com pequena variação de palavras, a reação do presidente Fernando Henrique, do secretário de Assuntos Estratégicos, Ronaldo Sardenberg, e do subsecretário de Inteligência da Presidência, Eduardo Jorge, foi a mesma: "O governo não tem nada a ver com isso". É exatamente o inverso, porém. O governo é que tem tudo a ver com o caso, desde que lhe cabem as responsabilidades de prevenir tais ocorrências e, se acontecidas, investigá-las até identificar os autores. Escuta telefônica é transgressão a princípios constitucionais básicos.
A extinção do SNI, substituído pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), não encerrou as atividades de espionagem interna. Ainda dominados pela monomania da subversão e pelo ódio ao que imaginem ser "de esquerda", embora indiferentes ao potencial de fermentação da miséria crescente, setores militares oficiais e correntes militares e civis mantêm, como se nada houvesse mudado, suas velhas atividades. Muita gente sabe disso, dentro e fora do governo.
A omissão de providências lembra que o governo tem o propósito de criar uma nova versão do SNI, a qual, sob o nome de Agência Brasileira de Informações e a sigla ridícula de Abin, seria pretensamente voltada para ações menos desprezíveis do que as do seu antecessor, situando-as no plano internacional. O SNI também nasceu com finalidades diferentes das que adotou, a ponto de seu criador Golbery concluir que criara "um monstro". A CIA também nasceu com objetivos estritamente internacionais, mas acabou qualificada no governo Carter pelo que o mundo inteiro sabia: central de golpes, assassinatos e todos os tipos de ilegalidades sórdidas. Este é o fim de tais agências, quando vicejam em ambientes dominados por monomania e ódios.
Em vez de criar um novo "serviço", o governo tem o dever de descriar o que permanece por aí dessas atividades antidemocráticas e, portanto, elas, sim, subversivas. Até porque a Contag de hoje pode ser o Fernando Henrique amanhã. Se ainda não é.

estrição
Anuncia-se para este mês, no Rio, o Encontro dos Economistas de Língua Portuguesa. O acesso, portanto, é restrito aos que não falam nem escrevem em português, só em economês.

Onírico
O governo lança o Plano Plurianual. Mais uma contribuição para a decadência da ficção brasileira. Os bilhões deste plano milagreiro são escritos em moeda apropriada: o irreal.

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