São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995
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Longe da hecatombe

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA

O dólar anda sossegado, com o BC (Banco Central) nas rédeas. Os juros caindo, como as projeções de inflação, com o BC nas rédeas.
Apesar do desaquecimento da economia, economistas e empresários esperam uma reação do nível da atividade econômica para o quarto trimestre deste ano.
Dizem que este trimestre, o terceiro, vai ser o fundo do poço. Só que, como a economia foi freada pelo estrangulamento do crédito, com fortes doses de juros altos e de aumento dos compulsórios, o tal poço está em um terreno absolutamente acidentado.
Quando o BC aumenta a liquidez, reduzindo o compulsório, a água (dinheiro) fica empoçada.
Em terrenos assim, para regar quem precisa, o BC acaba inundando quem não precisa. Depois, para impedir o afogamento, o BC lança seus botes de salvamento (títulos públicos).
O movimento das águas aponta para uma concentração de renda.
A diferença deste para os outros planos é que essa reconcentração não é suficientemente forte para anular os ganhos de certas camadas dos assalariados -especialmente dos que vivem com salário mínimo. Por que? Porque ela não está sendo acompanha por uma explosão de preços. Ao contrário.
Estes dois movimentos (de distribuição de renda e de concentração) é que acabam explicando o comportamento maluco dos indicadores de consumo (aquecido aqui e congelado lá).
Haverá mortos e feridos. É que o pano-de-fundo dessa guerra é a abertura da economia.
A concorrência externa está mudando muita coisa, até a lógica do enfrentamento -não dá mais para descontar, via preços, os tropeços cometidos.
Há dois meses os analistas previam quase que o fechamento dos portos, por falta de dólares. O Brasil fecharia o ano, projetavam, com reservas internacionais (o caixa do país em moeda forte) perto dos US$ 20 bilhões. Era o rescaldo da crise mexicana.
Agora, os mesmos analistas colocam no bolso do BC mais US$ 20 bilhões.
Esse ajuste -que se traduziu, recentemente, em novas medidas para limitar o ingresso de investidores estrangeiros- foi feito com juros estratosféricos.
O ajuste, de um lado ou de outro, tem como resultado o crescimento da dívida do governo. Por isso, os analistas começaram a olhar as contas públicas.
Mas, segundo os números de Raul Velloso, consultor econômico, o desastre, pelo menos na esfera do governo federal, é menor do que se projeta.
Em 1992 e 1993, o Tesouro fechou ao ano com um superávit primário (receitas menos despesas, sem levar em consideração os gastos com juros) da ordem de 0,6% e 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto, uma medida da riqueza produzida pelo país).
No ano passado, que registrou um aumento impressionante nos gastos com pessoal, o superávit, graças à arrecadação, cresceu para 2,7% do PIB.
Para este ano, com base nos números divulgados até junho, Velloso prevê um resultado menor, mas muito próximo do de 1994.
A despesa com o juro real (descontada a correção monetária) em todos estes anos girou ao redor de 1,5% do PIB. Ou seja, foi descomunal em 92 e 93, mas superada pelo ganho fiscal em 1994.
Velloso acredita em um custo ligeiramente maior com o pagamento dos juros para este ano, mas não o suficiente para "engolir" todo o superávit primário. Resultado: a situação das contas do governo federal não é tão dramática.
Assim, se estamos longe do paraíso, estamos também longe da hecatombe.

Hoje, excepcionalmente, deixamos de publicar a coluna de ANDRÉ LAHOZ, que escreve sempre às quartas-feiras.

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