São Paulo, quarta-feira, 6 de setembro de 1995 |
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Monólogo busca a sofisticação perdida
RENATO SZTUTMAN
Direção: Marco Aurélio Elenco: Ariclê Perez Onde: Teatro Sesc Pompéia (r. Clélia, 93, tel. 864-8544) Quando: ter. a sáb., às 21h, e dom., às 20h Quanto: R$ 10,00 "Quando subia para me deitar, meu único consolo era que mamãe viria beijar-me na cama". Com esta frase, a atriz Ariclê Perez abre o espetáculo "O Beijo", uma adaptação sua para o teatro do livro consagrado do escritor francês Marcel Proust (1871-1922), "No Caminho de Swann". A peça, em forma de monólogo, estréia hoje no Sesc Pompéia, dando início às atividades do projeto "Encontros Proustianos". A idéia do projeto veio da própria Ariclê, que confessa viver desde 1990 uma forte paixão pelos volumes de "Em Busca do Tempo Perdido". "Antes de terminar de ler o primeiro volume de 'No Caminho de Swann', comecei a sentir uma necessidade imperiosa de fazer uma adaptação para o teatro", conta Ariclê. O monólogo, retirado deste primeiro volume, versa sobre a descoberta do amor. O personagem, alter ego do escritor, rememora um percurso que vai desde o amor alimentado pela mãe, até o conhecimento da pequena Gilberte, filha de um vizinho, passando pelo afeto da babá Françoise. "Minha adaptação é simples. Cortei muitas passagens, deixando para a peça o que considero a espinha dorsal da obra", continua. Mas o trabalho de Ariclê não alcançou a concretude sozinho. Marcio Aurélio, outro inveterado apreciador de Proust, hoje assina a direção do espetáculo. "Na concepção do espetáculo, busquei a maior simplicidade possível, mantendo-me fiel à minuciosidade que habita este universo", afirma Marcio Aurélio. As definições de luz e espaço cênico são do próprio Aurélio. Para ele, o trabalho com a luz possibilita a criação de uma atmosfera tipicamente proustiana, marcada pela constância de digressões. "A platéia é convidada a efetuar uma viagem pelo tempo", argumenta. A preciosidade de detalhes -condizente com Marcel Proust- tem outro responsável: o figurinista João Santaella Jr. Definido por ambos, diretor e atriz, como mais um "proustiano", Santaella recriou o vestuário do começo do século. Toda esta engenharia proustiana de sensações não poderia deixar de lado a música original do maestro Júlio Medalha, que também faz a direção musical do espetáculo. O Quarteto Aldebarã, composto por flauta, violoncelo, viola e violino, executa estas composições, acompanhando todo o percurso do monólogo. "A música tem muito a ver com Proust. De um certo modo, ela é a fonte de toda sua inspiração", coloca Ariclê. Após o espetáculo, a platéia poderá fechar sua "vivência proustiana" com chave de ouro. Será servido, na saída, chá acompanhado de "madaleines". Para quem não sabe, "madaleine" é aquele bolinho de pão-de-ló, que, quando saboreado depois de mergulhado em chá quente, é capaz de evocar no narrador de "Em Busca do Tempo Perdido" reminiscências de toda sua infância passada no campo. Levando-se pela obra de Proust, o espetáculo "O Beijo" guia-se por um desejo não menos difícil do que o do autor de resgatar algo que se perdeu, no caso, uma linguagem sofisticada e literária, cada vez mais esquecida pelo teatro. Neste sentido, um desafio é anunciado. Texto Anterior: Diretores russos opõem cotidiano estável e nova situação política Próximo Texto: Projeto inclui palestras Índice |
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