São Paulo, sexta-feira, 15 de setembro de 1995
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Esporte brasileiro precisa encarar a Aids

VICENTE AMATO NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O mundo do esporte precisa passar a encarar com seriedade essa inimiga mais temível que qualquer atleta com a camisa adversária: a Aids. Embora os casos da doença registrados pela literatura médica em esportistas ainda sejam pouco numerosos, a discussão é importante devido ao grande contato físico envolvido -seja entre os atletas, seja entre estes e a equipe de apoio.
No Brasil, as entidades ligadas ao esporte estão em falta. Jamais houve conversas efetivas para se levar a uma normatização dos procedimentos diante do vírus HIV. Há coisa mais comum do que ver jogadores profissionais de futebol com sangramento sendo atendidos por profissionais sem luvas ou qualquer outra proteção, o que vai contra tudo que é recomendado?
Ainda há muito o que estudar sobre a relação entre esporte e Aids, como o risco específico de cada modalidade. Mas a experiência e a discussão no exterior já mostraram que o correto nessa área não é "caçar" os infectados e retirá-los das competições. Por questões éticas e médicas, o que interessa é adotar procedimentos preventivos universais que garantam a segurança de todos os envolvidos.
Sabemos que não existe vacina ou cura comprovada para a Aids. A prevenção é a única forma de combate. O esporte precisa se conscientizar de que as medidas de prevenção devem ser aplicadas a todos os atletas e integrantes de equipes médicas indistintamente, pouco importando se há ou não atletas com a infecção.
Alguns cuidados são rigorosamente obrigatórios, sempre que houver sangue ou líquidos orgânicos expostos: retirar o atleta do campo ou da quadra; usar luvas impermeáveis para tratar ferimentos; limpar a pele que tiver tido contato com as secreções, o mais rápido possível, com água e sabão; e evitar o contato com a saliva, embora não existam evidências seguras de que transmita o HIV.
Os atletas não devem ser submetidos a exames obrigatórios de HIV, por razões éticas e morais. E também por uma razão médica. Em 90% dos casos, o chamado período pré-sorológico (em que o vírus não é detectado pelos exames normais) é de dois meses. Nos 10% restantes, é superior a dois meses. Resultados negativos nessa fase da doença podem dar a ilusão de que o atleta não está infectado e um eventual descuido nos procedimentos preventivos -que, repito, devem ser sempre universais- pode ter efeito trágico.
O atleta portador do vírus pode perfeitamente continuar com suas atividades esportivas. Quando os sintomas da doença ainda não se manifestaram, é desejável que ele deixe as competições, mas continue praticando esporte. Esse abandono é recomendável não pelo risco de contágio, mas para poupar o próprio doente. Quando aparecerem manifestações que precedem à Aids ou se esta já estiver presente, a atividade física é desaconselhada porque comprovadamente contribui para debilitar o paciente.

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