São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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Demissões são transitórias, diz Malan

FERNANDO GODINHO
COORDENADOR DE ECONOMIA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As demissões que estão acontecendo nesta fase do Plano Real são transitórias e devem ser encaradas como "um ajuste em uma situação que era insustentável". A avaliação é do ministro Pedro Malan (Fazenda), em entrevista à Folha.
Apesar das pesquisas registrarem a tendência de queda constante da inflação, Malan afirmou que isso é insuficiente para uma "comemoração entusiasmada" por parte da equipe econômica.
Para Malan, seria uma "ingenuidade" pensar que a economia brasileira sairia de uma inflação anual de aproximadamente 5.000% para cerca de 20% "sem custos de adaptação".
O ministro acha que o aquecimento natural das vendas no comércio, neste final de ano, absorverá parte da mão-de-obra que vem sendo dispensada pela indústria.
A seguir, os principais trechos da entrevista:

Folha - Os dados recentes de desemprego são preocupantes?
Pedro Malan - É óbvio que qualquer informação estatística sobre aumento de desemprego preocupa o governo de qualquer país do mundo e o Brasil não é uma exceção a esta regra. Nós acompanhamos o assunto com o maior interesse.
Folha - Os custos sociais provocados pelo controle da inflação não seriam excessivos?
Malan - Tenho dificuldades em aceitar o argumento de que a preocupação do governo com a inflação está sendo levada longe demais. A queda da inflação e sua preservação em um patamar reduzido, com trajetória declinante, é uma condição imprescindível para que se possa segurar um crescimento sustentado com menor injustiça social.
Não tenho a menor dúvida de que para a maioria da população brasileira a inflação baixa é um objetivo a se alcançar.
Folha - Esta onda de desemprego seria, então, transitória?
Malan - Sim. O que está acontecendo agora é o ajuste em uma situação que era insustentável. As taxas de crescimento do primeiro trimestre deste ano -com o PIB crescendo a mais de 10%, a indústria a cerca de 15% e as vendas a 28%- eram incompatíveis com o programa de estabilização, pois não são sustentáveis ao longo do tempo.
Folha - Ou seja, não há como fugir deste custo social.
Malan - Tenho dito que a tarefa do governo é fazer com que este custo seja o menor possível e a fase desta transição também. Mas é ingenuidade imaginar que, de uma maneira mágica, você passa de uma inflação de 5.000%, que aconteceu nos 12 meses anteriores à introdução do real, para a situação que estamos agora. Ainda há muita coisa a fazer. Não há nenhuma razão para uma comemoração entusiasmada.
Folha - Até quando o desemprego continuará crescendo?
Malan - Vai ser transitório. Acho que sazonalmente, agora no final do ano, haverá uma elevação de vendas. Parte deste desemprego tem a ver com o fato de que as indústrias chegaram a operar em três turnos -o que não é o normal. Mas gostaria de chamar atenção para um dado: há uma tendência mundial de robotização, de automação e elevação do nível tecnológico da empresa para que ela possa competir internacionalmente. Mas isso não significa perdas permanentes de emprego. Surgem outras possibilidade e postos de trabalho em outras áreas de atividade na economia.
Folha - Que medidas o governo pode tomar para combater o desemprego?
Malan - Há vários anúncios de investimentos e eles estão sendo feitos porque as empresas estão apostando no futuro do Brasil. Estes investimentos representam a criação de novos empregos. A função do governo é criar um ambiente macroeconômico com inflação baixa e em queda, que possa estimular o investimento privado e concentrar os investimentos do governo nas áreas sociais. O objetivo não é ter inflação baixa por ter inflação baixa.
Folha - O sr. já disse que será desmontada a parafernália de restrição ao consumo. Este desmonte vai ser total ou as medidas tomadas até agora satisfazem a equipe econômica?
Malan - Vou usar uma palavra que muitos não gostam. Este é um processo de flexibilização, gradual. É claro que terá continuidade. O que está se discutindo é a velocidade deste processo. Entendo que alguns gostariam que ele fosse muito mais rápido. Mas as pessoas reconhecem que as taxas de juros baixaram, que já liberamos e vamos continuar liberando os compulsórios retidos no Banco Central, que as restrições ao crédito foram reduzidas.
Folha - Qual a velocidade que o sr. defende?
Malan - Defendo uma velocidade que leve em conta a evolução da situação. Nossa intenção é preservar o programa de estabilização. Não é verdade dizer que toda a economia brasileira está em recessão.
A última coisa que nós gostaríamos de repetir é a trajetória do Plano Cruzado, ou seja, mais uma experiência fracassada de estabilização por incapacidade do governo em manter sob controle a situação macroeconômica. Era o risco que estávamos correndo em março deste ano.

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