São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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Choque da globalização dá rumos para Etchenique

NELSON BLECHER
DA REPORTAGEM LOCAL

Nos últimos dois anos, o executivo Ricardo Etchenique, 38, foi submetido a um batismo de globalização. Designado para atuar na área de desenvolvimento da norte-americana Whirlpool, líder mundial de eletrodomésticos de linha branca, com vendas que superam a casa dos US$ 8 bilhões anuais, Etchenique testemunhou na prática técnicas de planejamento estratégico que, no país da inflação, eram conhecidas apenas de textos acadêmicos.
"Essa área está voltada para detectar hábitos futuros dos consumidores para lançamentos de modelos no prazo de quatro a cinco anos", conta.
Como uma dessas tendências indica que haverá cada vez mais gente trabalhando em casa, refrigeradores e outros aparelhos domésticos terão de ser silenciosos -além de facil e seguramente manipulados por crianças, no caso de lares em que as mães terão uma atividade profissional.
O estágio nos negócios globais, que incluiu viagens de Saint-Joseph (em Michigan, norte dos EUA, onde fica a sede da Whirlpool), a países europeus, fortaleceu em Etchenique a idéia de implantar alguns processos em que "norte-americanos são craques."
Desde que assumiu, em maio passado, a direção comercial da Multibrás, braço do grupo Brasmotor (cujos principais acionistas são o Bradesco e a Whirlpool), Etchenique comanda um programa de reestruturação.
Vai da informatização da rede de serviços autorizados ao gerenciamento de informações capazes de identificar -"e, se possível, superar"- a expectativa dos consumidores. Em breve, vendedores visitarão os clientes equipados com laptops. "Trata-se de enorme investimento", diz ele, sem revelar a cifra.
Tais esforços, segundo afirma, se tornaram imprescindíveis para manter a fidelidade dos consumidores que, confrontados com produtos estrangeiros, economia, irão cobrar das indústrias nacionais cada vez mais qualidade em termos de tecnologia e design.
"O programa visa, enfim, nos adaptar à realidade de um mercado cada vez mais competitivo", afirma ele, de olho na chegada ao país de concorrentes internacionais, como as coreanas Samsung e Gold Star. "O Brasil se tornou estrategicamente importante para companhias que ambicionam o mercado sul-americano".
Tanto que a Sasco, outro braço do Brasmotor, planeja ampliar de atuais 28% para 40% sua participação de vendas nessa região até 1999.
Essa hegemonia não gera ilusões de liderança eterna. A empresa vai investir US$ 300 milhões nos próximos cinco anos. Para defender sua fatia, avisa Etchenique, a Multibrás vai se valer da aliança com a Whirlpool, seja para importar modelos inéditos, seja para incorporar know-how da corporação mundial às suas marcas.
Ele considera gigantesco o potencial de mercado para eletrodomésticos que, ao contrário de refrigeradores e fogões, ainda não atingiram grau elevado de saturação. Por isso, ele prevê, as vendas de equipamentos -de freezers a lava-louça, de secadora a forno microondas- deverão somar, no futuro, acima de 50% do faturamento.
"A globalização, que contribuiu para concentração das indústrias, também já chegou ao varejo", constata Etchenique, ao evocar a recém-estréia da Wal-Mart no país. "O ideal seria vender para o maior número possível de empresas, mas somos realistas."
Ricardo é um dos quatro membros da terceira geração dos Etchenique no grupo, que surgiu em 1945 para revender veículos importados da Chrysler e acabou por se tornar o maior exportador mundial de compressores, através da subsidiária Embraco. A previsão de faturamento em 1995 alcança US$ 2 bilhões.
A particularidade é que, embora o grupo sempre tenha sido comandado por um representante da família -o pai, Hugo Miguel, é presidente do Conselho de Administração- nenhum deles jamais deteve o controle acionário.
Os Etchenique, informa Ricardo, possuem hoje menos de 10% das ações. "A filosofia de capital aberto data da época da fundação", diz o executivo, que pisou nas empresas do Brasmotor quando ainda cursava Direito no Mackenzie.
Como pretendia se especializar em jurisprudência comercial, cumpriu estágio no departamento jurídico, posteriormente ampliado para outras áreas industriais. Acabou se envolvendo com o departamento de vendas e marketing e foi convidado a substituir o gerente do escritório carioca. Foi promovido a diretor em 1989.
Ricardo diz, no entanto, inexistir qualquer garantia de ascensão profissional na carreira que, a exemplo dos colegas, é submetida ao crivo do comitê executivo.
"Aqui não existe nepotismo. Desde o início, meu pai sempre dizia que só subiríamos se fossemos competentes. Estou competindo em igualdade com outros executivos, ou até desigualdade, por ser filho do presidente do conselho", acrescenta Ricardo -que recentemente se uniu a três amigos para tocar paralelamente um negócio próprio, a Magic Imagic, especializada em sistemas domésticos de informática e home-video.

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