São Paulo, segunda-feira, 18 de setembro de 1995
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Avanços e retrocessos da reforma tributária

<UN->ROBERT JOHN VAN DIJK

ROBERT JOHN VAN DIJK
Recentemente, o governo encaminhou ao Congresso emenda constitucional que trata da reforma tributária e um projeto de lei que altera a legislação do Imposto de Renda Pessoa Jurídica. Uma avaliação geral da emenda que modifica o capítulo tributário da Constituição revela que a proposta do governo ficou muito aquém daquilo que era aguardado pelos mais diversos setores da sociedade. Basicamente, a emenda limitou-se à fusão do ICMS com o IPI, deixando intocadas as contribuições parafiscais que tanto oneram as empresas e suas folhas de pagamento.
Por sua vez, o projeto de lei do Imposto de Renda tem qualidades, embora subsistam aspectos negativos importantes. Dentre os avanços, destaca-se o novo desenho da estrutura tributária, pautado na simplicidade e nos princípios da equidade e da neutralidade dos impostos. Outro exemplo é o incentivo dado às empresas, permitindo apurar uma remuneração ao capital próprio, a ser distribuída aos sócios e passível de abatimento como despesa no cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica. A louvar, também, o fato de o governo isentar lucros e dividendos distribuídos, acolhendo antiga reivindicação das empresas e do mercado de capitais.
A nota dissonante do projeto fica por conta da extinção da correção monetária dos demonstrativos de resultados das empresas e do novo tratamento conferido aos ganhos de capital no mercado de ações, particularmente no que se refere aos investidores estrangeiros. No primeiro caso, a carga tributária das empresas poderá tornar-se excessiva, mesmo que a inflação decline para o patamar de 18% ao ano, parâmetro utilizado pelo governo como referência para as alterações do imposto.
No caso do novo imposto sobre ganhos de capital de não-residentes, faltou visão estratégica ao legislador. A atração de capital estrangeiro é um objetivo de qualquer país que deseje alavancar seu crescimento econômico num mundo caracterizado por crescente globalização das economias nacionais. No Brasil, o capital estrangeiro foi um dos principais fatores a explicar a valorização das companhias abertas brasileiras nos últimos anos, o que favoreceu especialmente o programa de privatização do governo.
São poucos os países que tributam ganhos de capital de estrangeiros nos mercados de ações. Dentre 44 países emergentes listados pelo International Finance Corporation, apenas oito prevêem esse tributo: Chile, Trinidad, Índia, Hungria, Eslováquia, Costa do Marfim, Nigéria e Zimbábue.
Países desenvolvidos, como a Inglaterra e os EUA, não tributam esses ganhos, restringindo a tributação aos investidores domésticos. Até porque os ganhos de não-residentes tendem a ser tributados em seus próprios países de origem.
Se existe algo que realmente desanima o investidor estrangeiro é a mudança súbita nas regras que condicionam o ambiente de sua atuação num país. Em menos de um mês, o governo alterou duas regras relacionadas ao capital estrangeiro: proibiu operações de "hedge" nos mercados derivativos e anunciou uma tributação gradativa sobre ganhos de capital a partir de 1996.
A prevalecer a medida agora proposta, é de se esperar um esvaziamento no fluxo de capitais destinados à economia brasileira e uma transferência de parcela dos negócios das Bolsas brasileiras para os mercados internacionais, onde já se negociam ADRs de companhias brasileiras. Negociando os ADRs lá fora, o investidor estrangeiro não paga o tributo brasileiro, evita as dificuldades burocráticas para ingressar capital no Brasil e ainda pode realizar operações de "hedge" para proteger o valor de seu investimento -possibilidade que agora lhe foi negada no Brasil.
Assim, cabe aos parlamentares corrigir a tempo os equívocos da proposta governamental. Removendo essas imperfeições, a reforma tributária será um fator importante a contribuir para o progresso do país. Mantendo-as, restará pouco além do retrocesso no programa de abertura e modernização da economia brasileira.
Com a palavra, o Congresso Nacional.

ROBERT JOHN VAN DIJK, 37, é diretor-executivo da Schahin Cury Corretora de Câmbio e Valores Mobiliários. Foi vice-presidente da Bolsa de Valores de São Paulo (1992-94).

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