São Paulo, sábado, 23 de setembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Salada de frutos

JANIO DE FREITAS

De certa feita foi o chuchu, lembra-se?, responsabilizado nos tempos de Geisel pela alta da inflação. Ao que parece, comemos tanto chuchu naquele mês que, enfastiados, não mais lhe permitimos o papel de galã inflacionário. Mas na natureza nada se perde, tudo se transforma, e o chuchu passou por uma plástica: conservou semelhanças de forma, porém melhorou a cor e aprimorou muito o sabor.
Está explicada pela evolução a expectativa dos economistas: é do mamão que se espera, com a alegada baixa do seu preço, a contribuição decisiva para que a inflação de setembro seja a menor dos últimos 44 anos. Neste ano mesmo, um dos sábios índices de inflação lhe atribuíra responsabilidade pela alta então ocorrida. Agora, a redenção.
Nunca supusemos que o mamão fosse uma presença tão importante em nossas vidas. O máximo que lhe dedicávamos era a vigilância para evitar os cacófatos. Mas os economistas, se não sabem o que fazem, sabem o que comem. Enquanto nós outros, incautos, pastamos na alta ininterrupta dos aluguéis dos remédios, das escolas, dos impostos.
O exemplo
Ainda bem que Sérgio Motta, preparando-se para a cirurgia de hoje, ficou impedido de ler jornais. Escapou à emoção de saber que o ministro Marcos Vinicios Vilaça, presidente do Tribunal de Contas da União, condecorou a extinta estatal Coalbra com o título honorário de “exemplo de corrupção”.
Sérgio Motta era o presidente da Coalbra.
“O milagre das verbas”
O longo texto da carta é encabeçado pela data 14 de setembro de 95, mas o fax de transmissão registra a data 22 de setembro. O assunto é o meu artigo sobre verbas propostas por parlamentares no Orçamento deste ano, as quais, vetadas então pelo presidente Fernando Henrique, foram incluídas no seu recente pedido de verbas suplementares ao Congresso. Mas enormemente aumentadas. O presidente do DNER, ex-deputado Tarcísio Delgado, escreveu com o propósito de prestar esclarecimentos.
A iniciativa foi simpática, mas os números continuam não o sendo. O primeiro exemplo da intentada explicação refere-se aos vetados R$ 318 mil propostos pelo deputado Hilário Coimbra para a estrada Santarém-Rurópolis. Diz a carta: “Gostaria de informar que com este valor (R$ 318 mil) se pavimenta, no máximo, 2 km de rodovia. E, com os R$ 10 milhões solicitados (pelo governo), pretende-se pavimentar 40 a 50 km dos 1.000 a pavimentar da citada estrada”.
Por umas continhas primárias, constata-se que os 2 km mencionados sairiam à razão de R$ 159 mil por km. Logo, 40 a 50 km deveriam custar, no máximo, de R$ 6,360 milhões a R$ 7,950 milhões, e não R$ 10 milhões. No segundo exemplo tomado pela carta, o km passa de R$ 159 mil a R$ 216 mil. Como Tarcísio Delgado “reafirma (seu) incontestável esforço no sentido de modificar as práticas administrativas do DNER”, citando, entre outras, a “revisão da metodologia de orçamento e apropriação de custos”, talvez seja o caso de rever a revisão. E a razão do artigo anterior prevalece ainda: se as obras e verbas menores foram vetadas e de repente repostas e tão aumentadas, ou o veto era impróprio, ou o é a ressurreição engrandecida.
Tudo igual
Elevado, com a doença de Sérgio Motta, de secretário-executivo a ministro interino das Comunicações, Fernando Xavier é ex-diretor da Northern Telecom, uma das principais interessadas na privatização das telecomunicações.
Continua tudo em casa, portanto.

Texto Anterior: Loyola fala em idéias novas
Próximo Texto: Renegociação das dívidas estaduais racha governistas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.