São Paulo, sábado, 23 de setembro de 1995
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Crise mexicana: as reações na Ásia e na América Latina

RUBENS RICUPERO

O recente relatório sobre comércio e desenvolvimento da UNCTAD constata que as grandes economias asiáticas foram muito menos afetadas pela crise mexicana do que as latino-americanas.
Isso se reflete, por exemplo, no tratamento dispensado a essas regiões pela Moody's e pela Standard and Poor's, as duas principais agências especializadas em classificar as dívidas de longo prazo dos países, de acordo com a confiabilidade do crédito.
Na América Latina, essas agências coincidiram em conceder o "grau de investimento apenas a um país, o Chile (a Colômbia só mereceu tal classificação de parte da segunda agência).
Em contraste, na Ásia, sem falar da situação "hors concours dos quatro dragões, a Malásia e a Tailândia, que já dispunham do "grau de investimento, tiveram melhorada sua classificação, ao passo que a Índia e as Filipinas receberam o grau cobiçado.
Não se trata apenas, como se sabe, de uma questão de prestígio. É a classificação que indica o risco e, assim, determina os "spreads e outros custos financeiros.
Existe pelo menos um aspecto em que os mercados financeiros da América Latina e da Ásia se parecem. É no seu pequeno tamanho, comparado aos dos desenvolvidos.
Para se ter uma idéia da ordem de grandeza, estimava-se em 1992 que apenas os haveres dos fundos de pensão e das companhias de seguros dos maiores centros financeiros alcançavam cerca de US$ 5.600 bilhões.
Enquanto isso, o total médio da capitalização dos mercados emergentes era de US$ 48 bilhões na América Latina e mais ou menos o dobro na Ásia (US$ 100 bilhões). Como consequência, em tais mercados os preços são muito mais sensíveis à volatilidade dos investidores (lembrar a crise mexicana).
Existem, porém, algumas diferenças significativas entre o padrão financeiro prevalecente na Ásia e o característico da América Latina. No primeiro caso, os governos asiáticos continuaram a poder tomar dinheiro emprestado dos bancos mesmo durante a década de 80, benefício de que gozaram por terem sabido evitar a crise da dívida daquele período.
Três dos asiáticos (Malásia, Tailândia e Indonésia) receberam igualmente importantes investimentos estrangeiros diretos e, em geral, na Ásia, a maioria dos países conseguiu melhorar a situação do balanço de pagamentos.
Na América Latina, em compensação, houve um agravamento dos déficits quase em todos os casos. Com exceção da Colômbia e do Chile, o ingresso de recursos externos de curto prazo para Bolsas e outros fins superou acentuadamente os investimentos diretos.
Entre 1991 e 1993, por exemplo, cerca de 70% do aporte financeiro do exterior à Ásia foi sob a forma de investimento direto, o dobro da proporção destinada à América Latina.
Nesta última, a média da poupança em relação ao PIB, que era de 23,5% (1983-90), caiu para 19,3% (1991-93), enquanto o investimento estagnava. Já nas sete economias asiáticas mais dinâmicas, registrava-se aumento de 3% na poupança externa e de 4% nos investimentos.
O incremento do aporte de capital estrangeiro na Ásia esteve, portanto, associado a uma elevação e não diminuição da poupança doméstica.
Mesmo o investimento estrangeiro que encontrou o caminho dos países latinos foi, em boa parte, empregado para a aquisição de ativos já existentes, por meio das privatizações, de preferência à expansão da capacidade produtiva.
Conforme conclui o relatório da UNCTAD, a experiência da América Latina demonstra que as duas condições centrais para alcançar estabilidade macroeconômica e crescimento duradouros são os equilíbrios fiscal e do balanço de pagamentos.
Estes, por sua vez, não devem depender excessivamente apenas dos cortes nos gastos governamentais (em lugar do aumento da receita) e da repressão artificial das importações (em vez da expansão das exportações).
No início dos anos 90, o reaparecimento de fluxos maciços de capital para a América Latina permitiu alívio temporário e camuflou a ausência de uma verdadeira solução para o problema fiscal e para o constrangimento externo.
O resultado, porém, foi um enorme aumento na vulnerabilidade da região, tal como medido pelo incremento de exportações necessário para fechar a brecha externa caso se produzisse de novo um colapso no aporte de capitais (como ocorreu na crise mexicana).
Em 1990, na América Latina como um todo, bastaria que as exportações crescessem 2,5% para cobrir o déficit. Em 1994, essa cifra tinha explodido para 25%, enquanto nas economias mais expostas (Argentina, México, Peru) ela chegava a dramáticos 50%!

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