São Paulo, domingo, 24 de setembro de 1995
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Ajuste anual de valores

CLÁUDIO BERNARDES

Muito se tem discutido nos últimos dias sobre os reflexos da edição da MP (medida provisória) da desindexação sobre o mercado imobiliário.
Na prática, o que se observou foi a total paralisação do mercado em termos de vendas e de lançamentos. Por quê?
Não existe a possibilidade de venda de imóveis, nos prazos que vinham sendo praticados no setor imobiliário -entre 60 e 100 meses-, sem que haja equilíbrio econômico e financeiro nos contratos.
Alguns analistas parecem não ter entendido o que vem a ser exatamente esse equilíbrio.
Isso torna oportuno um esclarecimento a respeito. Equilíbrio do contrato significa receber o preço contratado. Nem mais nem menos.
Em um sistema econômico como o nosso -em fase de estabilização, mas ainda não estabilizado, ou seja, onde remanesce inflação-, não existe outra alternativa para vendas de longo prazo (uma vez admitida a atualização monetária em períodos anuais) que não seja um ajuste anual de valores.
Isso permite que as parcelas pagas durante aquele período reflitam exatamente o valor estipulado por ocasião da venda.
Os incorporadores e os consumidores -imbuídos do espírito de colaboração com o governo, no sentido de estabilizar definitivamente a economia- aceitam efetuar esses ajustes anualmente.
Isso apesar de os preços de materiais estarem livres para flutuar de acordo com o mercado. Aliás, como deve ser no contexto dos princípios liberais.
Alguns críticos dessa postura do mercado imobiliário -de preservar o equilíbrio econômico e financeiro- argumentam, de maneira simplista, que o setor, efetivamente, não aumentará mensalmente os salários que paga, e, assim sendo, não se justifica um ajuste anual que recupere as variações mensais.
Para as empresas imobiliárias, se não ocorrerem aumentos salariais e se os índices de construção não sofrerem alteração, obviamente nada haverá para acertar ao fim do ano.
Em resumo, não haverá necessidade de ajuste ao final de 12 meses. Por outro lado, se houver variação de custos de insumos ou de mão-de-obra, o ajuste anual é a única forma de trazer de volta o equilíbrio do contrato.
Para entender melhor o que é um ajuste anual de valores, imaginemos que uma empresa tenha vendido uma unidade por R$ 100 mil, valor a ser recebido em 24 meses e em parcelas iguais.
Suponhamos que, no primeiro ano, a inflação fique em torno de 3% ao mês. E também que um desajuste da economia leve esta inflação, no segundo período de 12 meses, para 6% ao mês. Sem o ajuste anual, o vendedor daquela unidade receberia 77% do preço contratado.
Suponhamos agora que, no segundo período, a inflação volte aos níveis praticados antes do Plano Real, em torno de 45% ao mês.
Nesse caso, sem o ajuste anual, o vendedor receberia 51% do preço contratado para a venda.
Na simulação apresentada, falamos de um contrato com prazo de apenas 24 meses. O que ocorrerá com contratos de 90 ou 100 meses? Não é nada difícil deduzir.
Ora, um mercado de elevado ciclo operacional não pode trabalhar com níveis de incerteza tão elevados.
Não existe outra alternativa senão a correção dessa distorção pelos condutores da equipe econômica -com exceção dos contratos de longo prazo.
Essa é a única forma de não colocar em risco toda a indústria imobiliária e de evitar as drásticas consequências que a paralisação do setor acarretará ao país.

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