São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 1995
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Juiz autoriza PMs a atirar em jovem que tentar fuga

VANDECK SANTIAGO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

O juiz Bartolomeu Bueno, titular da 1ª Vara da Infância e da Juventude, em Recife (PE), autorizou os PMs que fazem a guarda externa do presídio de Paratibe a atirar nos internos que tentarem fugir. Ele também autorizou os funcionários civis que fazem a guarda interna a usar cassetetes.
O presídio de Paratibe (região metropolitana) abriga 87 jovens infratores, em dois pavilhões. Em um deles ficam 56 jovens, que aguardam julgamento. No outro ficam os demais 31, que já estão cumprindo pena (classificada no Estatuto da Criança e do Adolescente como medida socioeducativa).
O juiz Bueno disse à Agência Folha que, caso o tiro resulte na morte do jovem, o autor do disparo não terá cometido um crime. "Ele terá agido no estrito cumprimento do dever legal, porque é obrigação do Estado impedir a fuga", disse o juiz.
Segundo ele, o "ato do funcionário do Estado que age no cumprimento do dever legal é, segundo o Código Penal, excludente da ilicitude", ou seja, não constitui crime. Sobre a utilização do cassetete, o juiz Bueno disse que o seu uso se justifica "como instrumento de defesa e contenção, de efeito preventivo".
A autorização do juiz Bueno causou revolta nas entidades de defesa da criança e do adolescente e dos direitos humanos em Recife.
Na próxima sexta-feira, o Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (formado por 14 integrantes, sendo sete representantes do governo e sete de entidades da sociedade civil) vai se reunir com o Ministério Público Estadual para discutir o assunto.
Para o presidente do Conselho, Ademar Marques, 32, a autorização do juiz Bueno é "um absurdo, um retrocesso enorme, um equívoco perigosíssimo". "Não é matando os menores que nós vamos resolver a situação", disse ele.
Desde que foi inaugurado, em agosto último, o presídio já passou por duas rebeliões. Antes de serem transferidos para lá, os jovens infratores estavam em prédio no centro de Recife. Em julho eles promoveram rebelião que durou 30 horas e resultou na morte de um rapaz, assassinado pelos colegas, segundo a polícia.
O juiz Bueno disse que o objetivo das autorizações é evitar fugas e garantir a defesa dos funcionários e dos outros internos que não aceitam participar das rebeliões.
Segundo ele, nem o uso do cassetete nem a permissão para que os policiais atirem nos jovens que tentem fugir contraria o Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor desde 1990.
"O uso do cassetete é o retorno da palmatória, extinta há mais de 40 anos", disse o advogado Marcelo Santa Cruz, do Cendhec (Centro Dom Hélder Câmara de Estudos e Ação Social), uma das entidades contrárias à medida.

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