São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 1995
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Rubalcaba brilha no Supremo Musical

CARLOS CALLADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os jazzmaníacos paulistas têm apenas hoje e amanhã para ouvir uma das maiores revelações do gênero na última década. O pianista cubano Gonzalo Rubalcaba, 32, está inaugurando em alto estilo o Supremo Musical, nova casa noturna de São Paulo.
Com apenas 80 lugares, decoração sóbria e dois "sets" musicais por noite, o Supremo decalca o ambiente intimista e esfumaçado de tradicionais clubes de jazz de Nova York, que também funcionam em subsolos.
As pequenas dimensões da casa oferecem uma atração extra: a possibilidade de ouvir música sem a mediação de microfones ou amplificadores. Um concerto de piano realmente acústico.
A platéia da noite de estréia, anteontem, mereceu a primorosa apresentação. Acompanhou os improvisos de Rubalcaba com silêncio absoluto e um grau de atenção dignos de iniciados.
A presença de pianistas notáveis, como Nelson Ayres, Amilson Godoy e Edsel Gomez, indicava o carisma do cubano.
Rubalcaba encontrou assim a atmosfera ideal para demonstrar suas duas facetas. Dono de uma técnica fora do comum, que costuma exibir em solos frenéticos e percussivos, ele revela também uma suavidade poucas vezes encontrada em músicos cubanos.
Abriu o concerto com a balada "I Remember Clifford" (de Benny Golson), em versão tão lenta e delicada, que até parecia estar dialogando com o silêncio da sala.
Mais impressionante ainda é a recriação de "Besame Mucho", tratada com uma suavidade que não fica devendo nada a um noturno de Debussy. Por incrível que possa parecer, Rubalcaba consegue extirpar toda a breguice acumulada nas interpretações desse bolero durante décadas.
Claro que, no repertório do show, não faltam também temas clássicos do "bebop", como "Ah-Leu-Cha" (Charlie Parker) e "Hot House" (Tadd Dameron), incluídos no último álbum do cubano ("Diz", Blue Note/EMI).
Na verdade, esses temas não passam de meros pretextos para improvisos radicalmente pessoais. Rubalcaba fragmenta o ritmo regular, estilhaça as melodias, subverte as harmonias.
Esses mesmos procedimentos acabaram transformando a versão da divertida "El Manisero" (de Moisés Simons) em um jogo: até que ponto é possível brincar com a melodia de uma canção conhecida sem desfigurá-la totalmente? Os sorrisos e as risadas da platéia deram uma boa medida.
Só mesmo um improvisador brilhante como Rubalcaba teria coragem de encerrar seu show com o bolerão "Perfídia". E ainda assim deixar a platéia sem fôlego.

Show: Gonzalo Rubalcaba
Onde: Supremo Musical (r. Oscar Freire, 1.000, tel. 011/881-2250, Jardins, zona oeste de São Paulo)
Quando: hoje e amanhã, às 21h e 23h
Quanto: R$ 40

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