São Paulo, quarta-feira, 27 de setembro de 1995
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A guerra do leite

ROSANITA MONTEIRO DE CAMPOS

É inaceitável o descompasso entre o discurso -democrático aberto- e a prática claramente anti-social do governo do Estado de São Paulo no que se refere ao programa de distribuição do leite à população carente do Estado.
O problema é grave e de grandes proporções, embora esteja sendo estranhamente ignorado pelos meios de comunicação e tratado com descaso pelo poder público.
As principais vítimas, como já se tornou hábito em nosso país, são as milhares de famílias e milhões de crianças carentes que dependem única e exclusivamente da iniciativa governamental para ter acesso àquilo que está, ou deveria estar, na base de todo Estado democrático e cidadão, o direito à vida e à boa alimentação.
Tudo leva a crer que estamos diante de uma manobra orquestrada, visando os interesses de grandes grupos econômicos, embora seja difícil imaginar que o governador de São Paulo, Mário Covas, esteja realmente a par de tudo o que se passa. Vamos então aos fatos:
1 - O governo inexplicavelmente reduziu o ICMS do leite "longa vida" de 18% para 7%, abrindo mão de uma fonte preciosa de recursos, o que é tanto mais estranho quando se sabe que o Estado está sem dinheiro para cumprir seus compromissos. Diga-se que o leite "longa vida" não faz parte da cesta básica.
2 - O governo anuncia que a partir do início de outubro irá cortar a distribuição de 170 mil litros de leite pasteurizado para os postos de saúde do Estado. A razão alegada é a falta de verbas.
3 - O governo do Estado anuncia que está estudando a substituição do leite comum pasteurizado pelo leite "longa vida" esterilizado para distribuir no programa do tíquete de leite.
As autoridades deveriam saber que só a embalagem do "leite longa" vida custa dez vezes mais do que a embalagem do leite comum.
O mais grave não é isso. A troca seria só inadequada do ponto de vista financeiro se não representasse, sobretudo, um enorme retrocesso do ponto de vista nutricional.
A Confederação das Mulheres do Brasil (CMB) realizou ontem, no auditório José Bonifácio da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, um ato público com a presença de autoridades e técnicos visando reverter esse processo de descaso para com a parcela mais carente da população infantil.
Essa é uma luta que deve contar com o apoio de produtores de leite, laticínios e distribuidores, todas categorias profissionais que serão duramente afetadas se o governo de fato resolver substituir o leite pasteurizado pelo "longa vida".
Exigimos a manutenção e ampliação do programa do leite. Nossa batalha é contra a miséria e pela vida, longa vida, de crianças brasileiras.

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