São Paulo, terça-feira, 2 de janeiro de 1996 |
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Ressaca virtual
MARIA ERCILIA
Baudrillard afirmou recentemente que cada vez mais as coisas são consumidas por antecipação e na fantasia, provocando "uma alucinação coletiva do virtual". Usou o exemplo da Internet, que para ele provocou um curto-circuito na imaginação do público. Um dos efeitos mais prosaicos disso é aquele momento em que você apresenta a Internet para um amigo, parente ou conhecido que pediu "para ver como é". A reação é invariável: "Mas é só isso? Não tem nada mais pirotécnico? Como as imagens demoram. E por que a linha cai tanto?". E por aí vai. "Mostrar a Internet" é como abrir um livro numa página a esmo para mostrar a alguém o que é um livro. Não tem graça. Ela aliás exige tanta imersão e tão pouca companhia quanto a leitura de um livro. Ao contrário do livro porém, a Internet permite o deslocamento constante da atenção. A mudança e sua velocidade se tornam um prazer em si, maior que o da leitura. Quando a "Enciclopédia Britânica" colocou uma versão na Internet surgiu uma questão interessante. Os editores da enciclopédia sabem que ela é mais vendida que lida, porque ter a Britânica em casa é status. A Britânica na Internet, porém, deixa de enfeitar estantes e só vai vender assinaturas na medida em que for realmente consultada. O fetiche cultural na Internet é ela própria e não seu conteúdo. Pelo menos enquanto durar a novidade. Interativo passivo MacLuhan estabeleceu definições de interatividade que podem ser surpreendentes hoje. Para ele, o meio mais participativo induziria maior passividade. O rádio não exige muito para a compreensão de sua mensagem. Portanto, permite que a pessoa fique menos passiva. Já a imagem da TV solicita mais a mente, portanto deixa o espectador mais entregue e assim por diante. A teoria de MacLuhan põe de ponta-cabeça todo aquele marketing da interatividade, que supostamente exigiria maior criatividade do usuário. Virtualidade real Mas ao contrário do que apregoa Baudrillard, a Internet deve ficar cada vez menos virtual. Depois da realidade virtual, teremos a virtualidade real -aquela que funciona. Afinal, se metade da frustração do primeiro passeio na rede vem do excesso de expectativa, a outra metade decorre da precariedade tecnológica. Daqui para frente, a rede vai ter de ser mais prática, ou as pessoas vão cansar de enfrentar limitações e desistir. Arriscando um pouco de futurologia para 96: uma das grandes batalhas tecnológicas da Internet deve ser entre o ISDN e a TV a cabo. O ISDN (Integrated Services Digital Network) é um serviço prestado por empresas telefônicas que permite um acesso de grande velocidade. Houve uma explosão na demanda de ISDN em 95. Era um serviço que existia há uns dez anos e ninguém dava muita bola. A Netcom, uma empresa de acesso à Internet, lançou agora um pacote ISDN pela bagatela de US$ 29 por mês nos EUA (30 horas). A Internet por TV a cabo, que permite um acesso ainda mais veloz, também deixou de ser uma virtualidade. A rede @Home está em fase piloto em Sunnyvale, Califórnia. As conexões da @Home chegam a 10 megabits por segundo para a casa do usuário. Só para dar uma idéia do que é isso, as três conexões Internet do Brasil inteiro com o resto do mundo têm dois megabits cada uma. Ambas têm problemas. A TV a cabo só funciona onde tem cabo, obviamente. O ISDN nem sequer existe em vários países, no Brasil por exemplo. A vantagem de usar o telefone comum é que ele está em toda parte. Mande e-mail para NetVox no endereço netfolha@sol.uniemp.br Texto Anterior: Livrarias têm novidades no início do ano Próximo Texto: É preciso saber perder um pouco Índice |
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