São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 1996
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O império da conversa

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Fernando Henrique acredita no verbo.
"O espírito do presidente é o diálogo", repetia ontem o líder do governo Luís Carlos Santos, lembrando que, neste governo, tudo se faz "sempre conversando".
E Fernando Henrique conversa, ou leva na conversa, ou tenta.
Para hoje, "como forma de afagar os governistas", o presidente marcou o café-da-manhã com uns e o almoço com outros.
E mais. "José Sarney vai representar o governo brasileiro no enterro de François Mitterrand", registrou o SBT. "O presidente do Senado viaja à França a convite do presidente Fernando Henrique."
José Sarney estava, como sempre, levantando empecilhos aqui e ali.
Nada mais civilizado do que uma boa conversa e um convite para que o antecessor pudesse voltar à convivência, ainda que formal, com os estadistas que considera seus iguais. E para que deixasse Brasília, o que já fez ontem à noite.
Mas o presidente da República não conversa apenas para levar alguém a Paris. Ele acredita no que fala, ao menos na aparência.
Por exemplo, ao insistir que "a sociedade brasileira amadureceu" e o Real entra em "nova fase", como disse ontem em cadeia de rádio.
Expressões assim Fernando Henrique repete cotidianamente, como fez, também ontem, na cerimônia de divulgação de um investimento no Rio. Este é um "novo momento na história" do Brasil, afirmou ele, ou reafirmou.
Um momento de democracia, de conversa, de argumentação, um momento em que impera a razão.
Longe, muito longe dali, a CNN informou sobre a guerra santa no Brasil, chamando pelo nome e dizendo que se trata, não de Record e Globo, mas de uma guerra de evangélicos e católicos.
E uma guerra em que o verbo, até a verdade, não importa. Uma mulher foi entrevistada para exemplificar que a conversa grotesca de Edir Macedo com os seus pastores em nada afetou os fiéis.
Em momentos assim, novos, a conversa e a razão de Fernando Henrique mais parecem um anacronismo.

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