São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

As universidades desestimuladas

ROBERTO SANTOS

Muito se tem falado, e algo se tem feito, nos últimos tempos a propósito da avaliação do ensino superior no Brasil. Nesse esforço tem preponderado o exame de cada instituição individualmente, envolvendo o seu corpo docente, os currículos, a infra-estrutura física, o desempenho dos alunos. Carece, entretanto, de urgente atualização o exame global e aprofundado da contribuição das universidades e escolas ao desenvolvimento sociocultural e à modernização da economia nacional.
Para atualizar informações a esse respeito, testar sua validade e aprofundar o debate, parece-nos indicado começar pelas universidades federais. A ação coordenadora do MEC sobre elas facilitaria os testes iniciais da validade do estudo, assim como a implementação das recomendações dele decorrentes.
Mais: em meio às muitas limitações sofridas pelas universidades nas décadas recentes, os programas de pós-graduação e pesquisa alcançaram considerável expansão e constante aprimoramento. Dentre os estabelecimentos oficiais, nos quais se localiza a maior parcela das pesquisas vinculadas à pós-graduação, as universidades federais são muito mais representativas, em seu conjunto, do que as estaduais.
Dificuldades de vários tipos têm se acrescentado a problemas crônicos, todos contribuindo para o clima de desestímulo que se está verificando em boa parte das universidades federais. Entre tantos fatores, devo destacar:
a) aposentadoria precoce, em massa, de professores temerosos de possíveis desvantagens caso retardassem a transferência para a inatividade. Não está ocorrendo a sua substituição com a devida presteza;
b) desproporção dramática entre as dotações para pessoal e as disponibilidades orçamentárias destinadas aos outros custeios e capital. Como o professor universitário ganha pouco, encontra suas compensações na própria natureza do trabalho, desde que lhe traga satisfação de ordem profissional e acadêmica. Quando as bibliotecas, os laboratórios e as atividades de campo não são devidamente apoiadas, a consequência fatal é o desestímulo.
Será que o aumento das dotações orçamentárias e a admissão de novos professores, quando ocorrerem, bastarão para mudar a atitude que vem preponderando nas universidades? Certamente que não. Que mais haverá a fazer?
Para o salto qualitativo e quantitativo observado nas últimas décadas quanto à pós-graduação e às pesquisas nas universidades federais, dois fatores contribuíram de forma inequívoca: o financiamento pelos órgãos governamentais que, sem responsabilidade direta na manutenção do ensino, distribuem bolsas e apóiam programas específicos de pesquisa, sujeitos a periódica e rigorosa avaliação; e a ênfase atribuída, nos últimos 30 anos, aos ramos básicos do conhecimento (matemática, física, química, biologia, ciências humanas e letras).
É fora de dúvida que os departamentos básicos, muito mais valorizados agora que no passado, constituem ambiente propício à formação de pesquisadores, o que só excepcionalmente ocorria nas escolas superiores isoladas da nossa antiga tradição. E como estarão os cursos de graduação? Será que vêm correspondendo às necessidades de uma sociedade que evolui tão rápido?
O ministro da Educação, Paulo Renato, desencadeou há pouco o audacioso Plano de Aperfeiçoamento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério. Em fase subsequente do governo FHC, seguramente, serão enfrentados os problemas do ensino superior.
Na oportunidade caberá analisar os estímulos recíprocos que vêm ocorrendo entre as universidades e a sociedade a que servem. Quando inseridas em economias muito dinâmicas, sentem-se as universidades desafiadas, sob constantes solicitações no sentido de pesquisar a realidade local, nacional e internacional como pré-requisito para empreendimentos inovadores e ousados.
Onde a comunidade é menos sensível às oportunidades de colaboração, mostra reduzido impulso realizador e tem sua economia baseada em técnicas mais rudimentares as universidades não se sentem estimuladas nem alcançam pleno vigor no desempenho de suas funções.
Por sua vez, as lideranças nacionais nos mais diferentes campos não têm sabido buscar em instituições de ensino e pesquisa tudo o que estas podem proporcionar para o benefício do país. A desesperança reinante nas universidades não se corrigirá apenas com providências administrativas, internas ao sistema. Elas responderão, sim, a um novo impulso de confiança e de fé, à reafirmação de prestígio, oriundo do reconhecimento de que nenhuma outra instituição pode substituí-las na realização dos fins colimados.
Mais que no passado, e mais e mais a cada dia que passa, a melhoria da qualidade de vida das gerações depende do desempenho das universidades. Obviamente cairá no vazio a conclamação que não vier acompanhada pela melhoria das condições materiais de trabalho.
Haverá como atingir tais objetivos em tempo hábil? Tornou-se urgente colher e analisar informações atualizadas que permitam redefinir o papel a ser assumido pelas nossas universidades, como parcelas de uma sociedade em via de profundas transformações. O amadurecimento desse debate conduzirá a novas propostas de modelos que aperfeiçoem os atuais e sirvam melhor ao futuro da nação brasileira.

Texto Anterior: REFORÇO; LEI DA SELVA; QUALIDADE TOTAL; POMBA DA PAZ
Próximo Texto: Uma alternativa para o Sivam
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.