São Paulo, quarta-feira, 31 de janeiro de 1996
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Buster Keaton estrela comédia sobre a Lei Seca

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Já se tornou um clichê dizer que Buster Keaton (1895-1966; amanhã se completam 30 anos de sua morte), um gênio absoluto do humor silencioso, não sobreviveu artisticamente à chegada do cinema sonoro. "Entre Secos e Molhados" (1933), de Edward Sedwick, é a prova de que, se o clichê é verdadeiro, a culpa não foi de Keaton.
O ponto de partida da comédia não é dos piores: durante a Lei Seca nos EUA, um empalhador de animais (Keaton) e um barbeiro (Jimmy Durante) resolvem montar uma fábrica de cerveja para serem os primeiros a fornecer a bebida quando a proibição for abolida.
Apesar de duros e burros, eles conseguem, e acabam arranjando encrenca com a polícia e com os gângsteres que controlam o setor.
Se o argumento é bom, o roteiro parece ter sido escrito de improviso, criando situações desconexas e pouco expressivas. Nada mais fatal para o humor de Keaton -um geômetra do riso- que essa frouxidão narrativa.
Pior que isso só a presença ruidosa de Jimmy Durante, um humorista tão tagarela quanto Grouxo Marx e Woody Allen, só que sem metade da graça de qualquer um dos dois.
Em princípio poderia parecer interessante contrastar o silencioso Keaton e o verborrágico Durante, mas o fato é que a estridência deste sufoca a sutileza daquele.
A todo instante o espectador tem ganas de mandar o imbecil calar a boca para que a graça sublime de Keaton emerja. Quando isso acontece, tem-se um vislumbre do que ele era capaz de fazer.
Duas dessas cenas são características do humor puramente visual de Keaton: a passagem em que um batalhão de barris o persegue por uma ladeira e a paródia de cena romântica em que, depois de tomar galantemente nos braços a mulher amada, ele não resiste a seu peso e cai de joelhos.
Ali está o gênio de Keaton: "timimg", precisão, economia. Humor físico e poético: o corpo do herói redesenhando o mundo.
Este foi o último filme protagonizado por Keaton nos EUA. Depois disso, ele viveria décadas de ostracismo e algumas fugazes ressurreições.
A fala mais eloquente desse gênio do silêncio talvez seja a breve frase que ele profere numa cena de "Crepúsculo dos Deuses": "Eu passo", diz ele singelamente numa mesa em que se joga baralho, com a melancolia de quem está a significar muito mais do que diz. Como a estrela decaída Norma Desmond, ele havia passado.

Vídeo: Entre Secos e Molhados (What! No Beer?)
Produção: EUA, 1933
Direção: Edward Sedgwick
Elenco: Buster Keaton, Jimmy Durante
Lançamento: Reserva Especial (tel. 011/605-6101)

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