São Paulo, sexta-feira, 4 de outubro de 1996
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Autora mescla lirismo e antipoesia

NELSON ASCHER
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O Nobel de Literatura deste ano foi concedido à poeta polonesa Wislawa Szymborska (pronuncia-se, mais ou menos, Vis-uá-va Chim-bór-ska), que, nascida em 1923 na cidade de Kórnik, vive desde os oito anos de idade em Cracóvia, sede de uma das mais antigas universidades da Europa centro-oriental.
O nome de Szymborska já vinha sendo cogitado há tempos e sua premiação não é uma surpresa. É, além do mais, justíssima, pois se trata de uma poeta de primeira ordem, cuja fama internacional tem crescido nos últimos anos, principalmente por meio de traduções para o inglês.
A mais recente e extensa foi acolhida com entusiasmo, no primeiro semestre deste ano, pelo "New York Review of Books", um indicador seguro de prestígio.
Sua obra -em que se mesclam, num texto seco e exato, lirismo e antipoesia, indagações pessoais e o peso do passado coletivo- dá uma voz pessoal e inconfundível a uma geografia trágica, uma história desastrosa e se destaca no âmbito tanto de uma rica tradição, quanto de uma geração notável.
Seu país, a Polônia, tem o duvidoso privilégio de se situar entre dois vizinhos ávidos e cruéis: a Alemanha e a Rússia. Repartido entre estes e a Áustria no final do século 18, ressurgiu depois da Primeira Guerra para ser logo tragado sucessivamente pelos nazistas (que perpetraram em suas terras a maior parte do Holocausto) e pelos soviéticos.
Szymborska é reconhecida como membro do triunvirato de poetas poloneses de sua geração, com Tadeusz Rozewicz (1921) e Zbigniew Herbert (1924), cujo mentor poético e intelectual é Czeslaw Milosz (1911; Nobel de 1980).
Uma excelente antologia que recolhe todos foi publicada no Brasil no ano passado ("Quatro Poetas Poloneses", tradução e prefácio de Henryk Siewierski e José Santiago Naud, Secretaria de Estado da Cultura do Paraná).
Eles estão também representados no recente "Céu Vazio - 63 Poetas Eslavos", organizado e traduzido por Aleksandar Jovanovic (Hucitec, 1996). Suas primeiras traduções brasileiras divulgadas pela imprensa, no entanto, foram realizadas pela poeta carioca Ana Cristina César, em colaboração com a polonesa Grazyna Drabik.
A obra de Szymborska fala desde o epicentro da sangrenta crise européia que dominou a história contemporânea. Ela fala com lucidez e força raramente igualadas em outros países, informada das inúmeras nuances político-ideológicas e lançando mão da miríade de recursos literários criados pelo modernismo internacional.
Não é à toa que vários comentadores -Joseph Brodsky entre eles- consideram o conjunto formado tanto por sua obra quanto pela dos outros três poetas, ou seja, a poesia polonesa do pós-guerra, como o mais importante dos que se escreveram na época na Europa, talvez em todo o Ocidente.

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