São Paulo, quarta-feira, 9 de outubro de 1996
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Grotowski defende o fim do público em "aula-espetáculo"

O diretor diz que "a pessoa que age não pode ser incomodada"

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Foram "aulas-espetáculos", como as que Ariano Suassuna deu ano passado. A diferença foi o tratamento dado ao público.
O autor pernambucano esforçou-se por fazer rir, brincar, comunicar. O diretor polonês Jerzy Grotowski desprezou o público, programaticamente.
Nos dois casos, foram tratados como ídolos, estrelas midiáticas, pelo mesmo público. Anteontem, no Cinesesc, Grotowski foi recebido com aplausos, gritos e expressões como "lá vem o papa". O papa tratou de colocar as coisas no lugar, logo.
Apresentou o vídeo de "Art as Vehicle", arte como veículo, realizado em 1990 e ainda a sua obsessão, que pode ser resumida como a supressão do público. Um filme, aliás, muito mal recebido no lançamento na Europa, o que talvez explique a defesa interminável, maníaca.
Registra um ensaio e depois "a ação" de 40 minutos, com um grupo multiétnico. (Uma ação com canções africanas e caribenhas, mas com "mise-en-scène" greco-judia, sendo Egito a suposta ponte. O resultado não poderia ser mais desenraizado, formal, linha branca.)
"Não é uma ação que conte história", avisa Grotowski. Alguma história que se entenda, nas obras dele, é só para manter o público "sereno", de modo a não atrapalhar os atores. "A pessoa que age não pode ser incomodada."
Ao final do filme, clara e estranhamente um esforço de alcançar o mesmo público que diz ser incômodo, Grotowski se explica.
Ele deixou para trás a arte como apresentação, de que tratou em "Em Busca de um Teatro Pobre", por exemplo, um "clássico" teórico dos anos 60, pela arte como veículo.
A expressão é usada desde dez anos atrás para descrever a sua "pesquisa" concentrada no "veículo" ator -sem público.
Um teatro, se é que se pode falar em teatro, "puro", em que a montagem "não se faz no mental do espectador", mas do ator; ainda assim, insiste Grotowski, não um teatro "narcisista".

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