São Paulo, terça-feira, 15 de outubro de 1996 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
O trigo, jogado aos porcos
ALOYSIO BIONDI Meses atrás, o presidente FHC foi ao Sul, anunciar solenemente uma política de apoio à produção de trigo, que nos últimos anos havia despencado de 6 milhões para 1,5 milhão de toneladas. Era época de semear, os preços internacionais haviam disparado por causa da violenta quebra da produção mundial e dramática redução nos estoques.Agora, é época de colheita. Os preços caíram devido à proximidade da safra nos países do Hemisfério Norte. Pior: os moinhos brasileiros não estão comprando o trigo. Resultado: pressionados pela necessidade de pagar dívidas assumidas com o plantio e trato das lavouras, produtores gaúchos e paranaenses estão sendo forçados a vender o trigo a preços ruinosos, com prejuízos. A quem? Aos criadores de porcos. O Brasil volta a viver uma situação inaceitável: trigo sem preço, mais barato que o milho, atirado aos porcos. Os produtores, novamente a caminho da ruína. Essa tragédia é consequência da "nova" política agrícola da equipe econômica, que decidiu extinguir a prática de compra de colheitas pelo verno. Ficam confirmadas análises desta coluna, de que sem a atuação direta do governo como comprador, os produtores (não apenas de trigo) ficam submetidos, na época da colheita, a manobras baixistas dos compradores. Sem estoques Para quem não sabe: pela política antiga, o governo não precisava comprar imediatamente a colheita dos produtores. Quando a safra chegava, o governo liberava crédito (os chamados EGFs -Empréstimos do Governo Federal), para que o produtor pagasse seus compromissos, e fosse vendendo a produção aos poucos. Somente quando os empréstimos venciam, e o produtor continuava com estoques porque os preços não tinham alcançado os valores mínimos garantidos pelo governo, é que esses estoques remanescentes eram comprados pelo governo (operações AGFs, Aquisição pelo Governo Federal). A equipe suspendeu tanto a compra quanto os empréstimos (EGFs) que permitiam ao produtor resistir aos especuladores. Sem inflação A equipe econômica não quer emitir dinheiro para comprar as safras ou permitir sua comercialização em melhores condições. Justifica o "arrocho" como uma necessidade, para combater a inflação. O argumento é falso. A esta altura, a agricultura é credora do governo. Nos últimos dois anos, o Tesouro recebeu alguns bilhões de reais com a venda de estoques de trigo, feijão, arroz, milho e soja, que foram leiloados exatamente porque as colheitas foram más -por culpa da equipe econômica. É hora de o governo devolver esse dinheiro à agricultura. Sem inflação - 2 É demasiado vesga, imediatista, a visão de que os gastos com a compra de safras agrícolas podem provocar inflação. O apoio ao agricultor, para garantir grandes safras, aumentaria a renda no interior, reaqueceria a economia -e, portanto, a arrecadação da União, Estados e municípios. Reduziria o déficit, a necessidade de emissões para cobrir "rombos". Em resumo: com sua visão imediatista, a equipe quer combater a inflação com "arrocho" nos gastos. Uma visão menos primária indicaria o caminho inverso, isto é, o aumento da arrecadação. Sem ministro - 3 O ministro Arlindo Porto, dito da Agricultura, defende a equipe econômica: "Por que o governo deveria fazer AGF ou EGF se os preços estão acima do mínimo e os mercados internacionais sinalizam preços elevados?". A tragédia dos plantadores de trigo dá a resposta. E um ministro realmente da Agricultura estaria defendendo raciocínio inverso: o governo está totalmente sem estoques, e a situação do mercado é favorável, teoricamente, aos agricultores. Logo, o governo precisaria comprar pouquíssimo, emitir pouquíssimo, para esvaziar as manobras baixistas dos especuladores. É um absurdo que a equipe econômica impeça que o Estado tenha esse papel regulador, com pouquíssimo dinheiro. E prossiga com o "massacre da agricultura". Texto Anterior: Reeleição ou morte? Próximo Texto: Jornal dá destaque à Vale do Rio Doce Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |