São Paulo, terça-feira, 22 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Pé no freio em 1997?

CELSO PINTO

O mercado financeiro está ficando cada vez mais desconfiado de que o governo vai ser obrigado a pisar no freio, em meados do próximo ano, para não deixar o déficit na balança comercial chegar a um nível explosivo.
Ao ritmo atual, a trajetória da balança comercial é preocupante. Depois do déficit de US$ 655 milhões em setembro, existem projeções no mercado de um déficit em torno de US$ 800 milhões para este mês. Para este ano, embora a maioria das estimativas fique entre US$ 3 bilhões e US$ 3,5 bilhões, já há quem trabalhe com um déficit de US$ 4 bilhões.
O financiamento externo para o déficit deste ano está dado, portanto o que interessa discutir é o tamanho do buraco do próximo ano. As estimativas variam, mas houve uma forte deterioração nas expectativas nos últimos seis meses.
O exemplo mais expressivo talvez seja o do banco americano JP Morgan. Na sua publicação "World Financial Markets" de 29 de março deste ano, a previsão era que a balança comercial brasileira apresentasse um superávit de US$ 1,1 bilhão neste ano e de US$ 1,4 bilhão no próximo.
Na mesma publicação divulgada em 27 de setembro, seis meses depois, a previsão passou a ser de um déficit de US$ 3,4 bilhões neste ano e de US$ 8,4 bilhões no próximo. Ou seja, os economistas do banco fizeram uma revisão, para pior, da balança comercial num total de US$ 4,5 bilhões neste ano e de US$ 9,8 bilhões em 97.
O Morgan não está sozinho nesse tipo de previsão, embora tenha saído, claramente, da posição de um dos mais otimistas para um dos mais pessimistas no mercado. Outro grande banco americano está projetando um déficit comercial superior a US$ 8 bilhões no próximo ano, se a economia continuar na marcha atual.
Só que esse banco, a exemplo de vários outros analistas, duvida que o governo deixe o déficit comercial chegar a um valor como este na entrada do ano decisivo da eleição presidencial, em 1998. A hipótese é que, em algum momento, o governo volte a segurar a economia no próximo ano, para evitar uma deterioração maior da balança e abrir espaço para um crescimento mais expressivo em 98.
O déficit do mês passado foi influenciado por uma compra extra de petróleo, perto de US$ 200 milhões, e uma queda excepcional de US$ 120 milhões das exportações no último dia útil. Mesmo descontando esses fatores, contudo, a trajetória continua preocupante.
As exportações continuaram a perder dinamismo na segunda semana de outubro, indicando um total em torno de US$ 4,1 bilhões a US$ 4,2 bilhões para este mês. As exportações de manufaturados acumuladas no ano e comparadas ao mesmo período do ano passado chegaram a crescer 15% até fevereiro. Desde então, essa taxa vem caindo, para 10% em abril e 5% em setembro.
Do lado das importações, a expectativa é que haja um forte aumento nas compras de bens de capital neste mês e no próximo. Por uma razão prática: houve adiamento de compras, à espera da entrada em vigor, em novembro, da lei que isenta de ICMS essas importações.
As importações de matérias-primas, por sua vez, têm mostrado um ritmo crescente, seguindo a recuperação da economia. A queda acumulada no ano era de 6% até junho, passou a 2,9% em julho, 0,6% em agosto e virou um crescimento de 2,8% em setembro. O que indica que o ritmo crescerá ainda mais com a retomada mais firme do crescimento em 97.
As compras de petróleo são uma incógnita. Se as importações extras da Petrobrás, para formar estoques estratégicos, não ficarem restritas a setembro, o déficit no ano pode chegar à casa dos US$ 4 bilhões.
Mesmo que o déficit comercial chegasse a mais de US$ 8 bilhões em 97, ele poderia ser financiado por investimentos diretos, financiamentos e alguma perda de reservas. Só que um número desse tipo deixaria muitas dúvidas, no mercado, sobre as contas de 1998, um ano, em si, complicado em função da sucessão presidencial. E deixaria o país mais vulnerável a alguma má notícia externa, como um eventual agravamento da situação na Argentina.

Texto Anterior: Cresce protesto de índios no Maranhão
Próximo Texto: Governo negocia privilégio parlamentar por reforma
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.