São Paulo, quarta-feira, 23 de outubro de 1996
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Pierre Lévy critica intelectuais "apavorados com a novidade"

Professor de hipermídia está no Brasil para conferências

GISELLE BEIGUELMAN
DO UNIVERSO ONLINE

Pierre Lévy, 40, professor do Departamento de Hipermídia da Universidade de Paris e autor, entre outros, de "O Que É o Virtual?" (recentemente lançado pela editora 34 Letras) está no Brasil para uma série de conferências sobre novas teorias no contexto do "cyberspace".
Ele é uma voz dissonante frente ao "catastrofismo" da intelectualidade francesa em relação à crescente virtualização do cotidiano, defendendo a idéia de que o "cyberspace" é o meio em que será possível se consolidar a tecnodemocracia. Essa tecnodemocracia seria uma nova formação política onde os meios técnicos viabilizariam o desenvolvimento de comunidades inteligentes, capazes de se autogerir.
Em entrevista à Folha, ele falou sobre as perspectivas e os impasses da Internet.
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Folha - Como se dá a interface entre a idéia de tecnodemocracia que o sr. propõe e os poderes políticos nacionais?
Pierre Lévy - Não é possível falar de uma realidade do espaço virtual alheia às realidades políticas e o grande perigo da Internet é justamente ela ser confiscada pelo puramente comercial. Para que a tecnodemocracia seja possível, é preciso agir sobre os governos exigindo controle de tarifas de acesso, cabeamento, disponibilização de linhas telefônicas e barateamento de equipamentos.
Folha - Qual é o principal impacto cultural da virtualização do cotidiano?
Lévy - A virtualização do cotidiano e, especialmente, a Internet, estão nos obrigando a conceber uma nova arquitetura, uma arquitetura dos espaços de comunicação e do conhecimento, que tem por desafio político conciliar a cidade "real" e o "cyberspace". Estamos vivendo um momento em que descobrimos novas formas de organização e transmissão das tradições.
Folha - Alguns intelectuais franceses, como Paul Virilio e Baudrillard, vem criticando duramente a Internet, apontando para a emergência de um cyberfascismo e de uma cultura de superexcitados que estariam substituindo os antigos super-homens. Como o sr. se posiciona frente a essas críticas?
Lévy - Esses intelectuais fazem parte de uma época em que uma casta de homens cultos detinha o monopólio do saber e do conhecimento. A Internet é uma prova contundente de que eles perderam o poder que detinham. Temos informação e conhecimento disponível, hoje, numa escala que para eles é desmedida. Eles não são mais os meios privilegiados de transmissão do conhecimento. No entanto, tenho certeza de que não entendem nada de Internet. Virilio nunca viu um correio eletrônico na vida! São críticas de alguém que está apavorado com a nova realidade. Navegar é deixar-se levar pela rede. É essa liberdade que intelectuais como Virilio identificam com barbárie e não podem tolerar.

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