São Paulo, quarta-feira, 23 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Nan Goldin faz '20 Anos de Balada' em SP

ERIKA PALOMINO
COLUNISTA DA FOLHA

Nan Goldin está entre nós. A fotógrafa americana de 43 anos chegou ontem a São Paulo para a abertura de sua mostra na cidade, amanhã no espaço Alumni.
Nan Goldin é um dos principais nomes da atualidade. Abriu caminho na história da fotografia a partir dos anos 80 ao expor seu universo pessoal. "Meu trabalho é sobre minha vida com meus amigos, minha conexão emocional com as pessoas que conheço há 20 anos. Como um álbum de família", disse Nan Goldin em entrevista à Folha ontem à tarde.
O tom é sempre de intimidade com o personagem. A fotógrafa aparece com um olhar quase cúmplice, dentro da privacidade das pessoas, em que confiança é palavra-chave. O clima é doméstico; os cenários são quartos, casas, banheiros, hotéis, bares, trens.
O clima, entretanto, muitas vezes recai sobre um aspecto underground, em que drogas, bebedeiras, decadência e alguma violência se misturam a um tom de romantismo e (anti)glamour. Não há distanciamento, juízo de valor ou voyeurismo no trabalho de Goldin. Apenas humanidade.
O trabalho de Goldin se mistura, assim, a sua vida pessoal. A exposição "Nan Goldin - 20 Anos de Balada" consiste numa minirretrospectiva de 76 a 96, com título num feliz trocadilho com o termo balada (gíria para noitada com bebida e/ou drogas) e uma das mais expressivas obras da artista, "Ballad of Sexual Dependency" (a balada da dependência sexual). Coincide também com a mais importante mostra sobre a artista, em Nova York (leia texto abaixo).
Trata-se do ápice do reconhecimento artístico ao trabalho da fotógrafa. Goldin não se abala.
"Não me interessa ficar famosa, quero só pessoas entendam meu trabalho. Muitas vezes ele é entendido, mas a maior parte do tempo ele é mal-interpretado.
que vê também sua influência em boa parte da fotografia de moda, de estilo e comportamento, bem como na publicidade.
Nomes da nova geração da fotografia, hoje consolidados, como David Sims, Juergen Teller, Wolfgang Tillmans, Craig McDean e Corinne Day só existem devido ao pioneirismo de Goldin. Inspirada, por sua vez, em "Tulsa", de Larry Clark (diretor de "Kids").
Esse estilo documental começou a tomar forma com a chamada escola de Boston, um grupo de artistas da cidade americana frequentando a School of the Museum Fine Arts e o Massachusetts College.
Como denominador, seus estilos de vida fora da dita normalidade, já em universos de sexualidades alternativas, drogas e experimentalismos de várias formas. São eles, além de Goldin, Philip-Lorca diCorcia, Jack Pierson, Mark Morrisroe, Shellburne Thurber, Taboo! e David Armstrong.
Este último, companheiro de vida de Goldin. Foi ele quem deu a primeira máquina fotográfica a ela, bem como seu apelido, para Nancy. Os dois se conheceram aos 14 anos, quando ela saiu de casa. Três anos depois do suicídio de sua irmã mais velha, aos 18 anos.
Esse fato é profundamente marcante para Goldin. É o que ela relata no filme autobiográfico "I'll Be Your Mirror" (eu serei seu espelho, também título do catálogo da exposição do Whitney, seu oitavo livro). "Nunca mais quero perder a memória real de alguém", conta.
Dessa forma, sua memória com Armstrong é o assunto de "A Double Life", colaboração com o amigo sobre um universo de travestis recorrente em seu trabalho.
Pela proximidade com o universo homossexual, muitos amigos de Goldin têm suas vidas marcadas pela Aids, que vira objeto de algumas de suas mais delicadas fotos.
A própria trajetória de Goldin é tema central. Seus vários momentos -com olho roxo, muitas vezes em dramáticas situações emocionais-, são linha condutória.
Para quem pergunta, Goldin vem ao Brasil "mais velha e mais quieta", fora do circuito drogas/álcool, depois de um período numa clínica de reabilitação, em 88.

Mostra: Nan Goldin - 20 anos de Balada
Quando: abertura amanhã, às 19h30. Até 20 de dezembro, de segunda a quinta, de 9h às 22h. Sexta, de 9 às 19h.
Onde: Centro Cultural Alumni - r. Brasiliense, 65, tel. 011/523-3655.

Texto Anterior: Mostra em NY invade intimidades
Próximo Texto: Buemba! Buemba! Timão Violado no Morumbi!
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.