São Paulo, domingo, 27 de outubro de 1996
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'Advogado joga com interpretações'

DALMO DE ABREU DALLARI

"Na formação jurídica sempre há a possibilidade de várias verdades. Isso é objeto até de brincadeiras. Quando se diz isto: para o engenheiro dois e dois sempre dá quatro. O advogado diz: 'veremos, não é?'. Porque ele sempre pode jogar com uma série de interpretações. Isto acaba criando uma possibilidade de flexibilidade maior na formação do jurista, o que, por sua vez, acarreta uma consequência grave. É que o jurista que teve uma ação não-democrática é porque ele não era democrata pura e simplesmente. Ele tinha escolha.
E, na verdade, se nós examinarmos as próprias correntes de pensamento jurídico (...), numa síntese, eu diria: há uma corrente -que é a que prevalece ainda hoje no Brasil- que é a chamada positivista, que teve o cuidado de esvaziar o direito de qualquer conteúdo. Então, o direito não tem compromisso com a Justiça. O direito é uma forma, e a síntese desta posição eu poderia dar numa discussão que tive com um colega -um positivista muito respeitável. Quando nós discutíamos determinada lei, eu disse: 'Mas esta lei não é justa'. Ele disse: 'Não, justiça não é problema de jurista, é do filósofo'. E, daí a pouco, ainda argumentando, eu disse: 'Mas esta lei não resolve conflitos sociais'. Ele disse: 'Conflito social é o problema do sociólogo'. Bom, mas e aí sobra o quê? Sobra um vazio que aceita qualquer conteúdo, que pode ser o da ditadura ou o da democracia."

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