São Paulo, quinta-feira, 14 de novembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Quando virá a freada?

CELSO PINTO

Que o governo deverá frear a economia no próximo ano, pouca gente duvida no mercado financeiro. A dúvida é saber quando e de que forma.
A maioria absoluta das apostas hoje está numa freada a partir de março, depois do Carnaval. Por esta razão, aliás, o mercado futuro de juros e de câmbio está concentrando negócios mais fortes e cotações mais ousadas para março.
Uma razão óbvia é que, se o governo cumprir a promessa de votar a reeleição na Câmara até o final de janeiro, haveria um constrangimento político menor, até porque a votação no Senado é considerada mais simples. Outra razão é mais técnica.
Ainda existem os que imaginam que a retração da economia no início do próximo ano poderá ser mais forte do que se imagina. Sempre no início do ano há uma retração natural, sazonal, no nível de atividade e seria prudente o governo ver a extensão do que vai acontecer antes de puxar o freio. Dois fatores poderiam ajudar a retrair a economia: a queda na massa de salários e um aumento na inadimplência.
A massa de salários real cresceu mais de 30% desde o início do Plano Real, mas, neste ano, apenas 4% até setembro. Um fator importante para o crescimento da massa de salários foi a combinação entre crescimento da economia e do emprego, no início do plano, com queda da inflação. Além disso, o rendimento médio das pessoas ocupadas, medido pelo IBGE, mostra um aumento de 28,5% entre a média de 94 e julho deste ano.
Mesmo depois que a economia desacelerou fortemente, no segundo semestre do ano passado, a queda da inflação continuou ajudando. Como muitos dissídios continuaram repondo integralmente a inflação passada e a taxa de inflação caiu fortemente, houve um aumento em termos reais nos salários.
Essa situação mudou. A inflação, desde agosto/setembro, passou a correr em níveis bastante baixos e não deverá haver quedas expressivas à frente. Além disso, os últimos dados indicam que cada vez menos dissídios têm reposto integralmente a inflação passada.
A favor da expansão da massa salarial, sobraram dois fatores: o aumento do rendimento médio e uma recuperação no nível de emprego, desde o pico de março passado.
Outro ponto importante é o nível de inadimplência. No mês de outubro começaram a surgir as primeiras indicações de que a inadimplência em crédito pessoal voltou a subir. Além disso, há sinais de desaceleração do crédito bancário.
Se uma menor pressão da massa salarial, somada a uma maior inadimplência, resultar num freio expressivo na economia no primeiro trimestre de 97, talvez o governo possa evitar medidas mais duras. Há, contudo, quem duvide.
A razão principal dos céticos é que a economia, neste final de ano, está crescendo a um ritmo de 6% a 7% ao ano. Portanto, para manter a economia dentro da expansão prevista de 5% seria preciso reduzir o ritmo de crescimento da economia. O efeito da inadimplência e da massa salarial, neste raciocínio, talvez baste para evitar uma expansão adicional, mas não para cortar o crescimento.
Outra razão para imaginar alguma ação mais forte em março é que prevê-se que os déficits na balança comercial continuarão no primeiro trimestre do próximo ano, um período sazonalmente ruim para a balança. Até março, o acúmulo de maus resultados recomendaria alguma medida mais forte pelo governo.
O grande defeito da teoria do freio em março é que todo mundo a conhece, inclusive o Banco Central. Logo, se quiser se adiantar ao mercado e impedir um acúmulo de expectativas negativas, talvez o governo acabe se adiantando. Há quem espere para já medidas de restrição ao financiamento às importações e ao crédito ao consumo.
Quanto ao conteúdo das medidas de freio, há consenso. Se o governo elevar os juros básicos, dará um tiro no pé: com uma dívida líquida de R$ 252 bilhões no final de agosto, juros mais altos farão disparar o déficit fiscal. Mais eficazes seriam medidas de restrição do crédito ao consumidor e elevação no compulsório bancário, algo que encareça o custo para o tomador do crédito, mas não para o próprio governo.

Texto Anterior: Empresa de Motta não pagou imposto
Próximo Texto: Itamar estuda entrar em pequeno partido
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.