São Paulo, quinta-feira, 14 de novembro de 1996
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Quem faz nhenhenhém para o presidente

ALOYSIO BIONDI

Agora, as previsões já são do próprio governo, mais exatamente da Conab: a safra que está sendo plantada neste ano vai ficar na faixa média de 75 milhões de toneladas, isto é, um novo fracasso, provocado pela falta de crédito e pelo massacre dos agricultores.
Bem longe, portanto, dos 80 milhões de toneladas que, em extensos artigos na imprensa ou entrevistas, a equipe econômica e o ministro da Agricultura vinham prometendo.
Agora, o presidente da República já tem condições de comprovar que -como esta coluna alertou várias vezes- sua equipe econômica estava longe da verdade ao alardear expressivo aumento no plantio este ano.
"By the way", como diriam os newcucarachos, seria importante que o presidente da República, em um momento de reflexão, fizesse um balanço e verificasse como o nhenhenhém otimista de sua equipe, em todas as áreas da economia nunca é confirmado pela realidade.
Ela previu um saldo positivo de US$ 2 bilhões na balança comercial neste ano -e o país está amargando o violento rombo; ela disse que as importações do começo do ano estavam altas para "reposição dos estoques", após as vendas do Natal de 1995, e iriam diminuir nos meses seguintes -e elas continuam em disparada; ela disse que as exportações estavam crescendo 10% sobre 1995 -e elas perdem terreno; ela disse, por volta de maio, que o desemprego já estava recuando etc. etc. etc.
Cabe ao presidente investigar duas hipóteses sobre o fracasso do nhenhenhém otimista: ou sua equipe econômica mente, para construir um clima de falso otimismo, ou ela vem implantando políticas completamente erradas, tanto que os resultados são exatamente opostos aos anunciados.
Em qualquer um dos casos, o nhenhenhém cor-de-rosa está afundando a economia, destruindo empresas, empregos, patrimônios empresariais e pessoais.
Enganado
Ainda na semana passada, o presidente FHC fez novo discurso, redigido com base em dados fornecidos pela equipe, cheio de auto-elogios à "política agrícola" do seu governo e com novas alfinetadas contra o nhenhenhém dos críticos.
Disse que a produção de feijão deste ano vai aumentar para 3,2 milhões de toneladas, contra 3 milhões em 1995. O avanço, em si, já seria ridículo. Mas, para piorar, ele não se deve a um pretenso apoio do governo -e sim à mera recuperação do nível da safra, que no ano passado sofreu com a seca.
Iludido
O presidente alardeou ainda uma grande "vantagem": nada menos de 70% da produção de feijão foi fornecida pelos micro e pequenos produtores, isto é, a chamada agricultura familiar.
Com esse número, o presidente pensou estar rebatendo críticas ao massacre dos agricultores. Um "avanço" do seu governo. Engano. Retrocesso.
Iludido - 2 Em caso de dúvida, o presidente FHC pode chamar o ministro dito da Agricultura e solicitar um estudo impresso pelo próprio ministério, em fevereiro deste ano, sobre o Pronaf, programa de apoio à agricultura familiar.
Lá, encontrará um dado: a agricultura familiar é apresentada como responsável por 78% da produção de feijão. Os 70%, portanto, seriam um retrocesso. Mentiram ao presidente.
Imparcialidade
Lógico que em nenhum país do mundo o presidente da República precisa conhecer em detalhe as questões econômicas, que vão da situação da agricultura à balança comercial.
O papel reservado aos chefes da nação é manter a capacidade democrática de ouvir as sugestões, alertas ou críticas formuladas por representantes de todos os setores da sociedade.
Acreditar que só ele, presidente, e sua equipe têm o monopólio do saber e da "defesa dos interesses coletivos" é o melhor caminho para ser enganado. E levar o país ao desastre.

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