São Paulo, segunda-feira, 18 de novembro de 1996
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Quem foi?

JOÃO SAYAD
O QUE FAZER COM O DÉFICIT DO BALANÇO COMERCIAL?

O discurso das autoridades afirma que devemos esperar e apresenta alguns argumentos razoáveis e outros exageradamente otimistas:
1) As importações de bens de capital acabarão por tornar as exportações mais competitivas -excessivamente otimista.
2) As privatizações de portos e estradas reduzirão os custos de transporte -muito otimista.
3) O déficit de US$ 5 bilhões neste ano -e outro tanto no ano que vem- pode ser financiado por influxos de capital, particularmente se a reeleição for aprovada. Pode ser, mas depende também da saúde de Ieltsin, da Argentina, do México e do Tesouro norte-americano. Argumento razoável, um pouco descuidado.
4) As montadoras que se instalam no Brasil exportarão uma parte da produção. Muito pouco provável, segundo algumas montadoras.
5) A isenção de ICMS sobre as exportações ainda não produziu os efeitos esperados. Pode ser.
6) Se nada disso der certo, a ordem é segurar o ritmo de crescimento da economia para diminuir as importações. Mas as importações estão crescendo mais do que a produção. Pode ser tentado, mas os custos são altos.
Os críticos da sobrevalorização cambial, como o professor Pastore, o deputado Delfim Netto e Paulo Nogueira Batista Junior propõem, desde o início do plano, que o câmbio seja corrigido. A proposta pode ser correta, mas gera outras questões:
7) Qual o impacto de uma desvalorização cambial sobre a taxa de inflação? O governo acredita que, quanto mais passa o tempo, menor o impacto de uma desvalorização cambial sobre a inflação.
Pode-se contra-argumentar que, quanto mais passa o tempo, mais os preços nacionais são influenciados por preços em dólares. Móveis, queijo, automóveis, água mineral e muitas outras coisas são importadas hoje em dia. As importações representam em média 15% do consumo brasileiro de quase tudo.
8) Desvalorizar o câmbio, bem antes de qualquer acúmulo de déficits comerciais, é melhor ou pior do que desvalorizar mais tarde, em cima de déficits comerciais acumulados? Antes de aprovar a reeleição ou entre a aprovação da emenda e a eleição?
9) Não se pode esquecer o efeito da desvalorização sobre os empréstimos em dólar do governo, das empresas e do setor financeiro. Depois da desvalorização, todos estarão com problemas de endividamento.
10) Se o câmbio se desvalorizar em x% e a inflação resultante for y%, o ganho do exportador será (x-y)%. Além disso, este (x-y)% pode durar muito tempo ou ser consumido por mais inflação. Pode variar para mais ou para menos.
Antigamente a taxa cambial era indexada e garantida contra qualquer variação da taxa de inflação. Hoje, câmbio maior é incentivo menos eficaz para aumentar as exportações do que entre 1967 e 1994.
Sem contar que antes tínhamos subsídios a exportações - Befiex, Proex- e o governo dava prioridade às exportações. Será que uma desvalorização cambial é suficiente para aumentar os investimentos em exportação?
A questão básica e grave é que, mesmo no longo prazo, é difícil dizer como será a evolução das exportações. Por que as exportações brasileiras crescerão mais depressa? Mão-de-obra mais barata do que em outros países do mundo? Vantagens e qualidade da nossa infra-estrutura? Vantagens de clima e recursos naturais? Indústria com tecnologia especial?
Tudo isto leva a uma pergunta final: quem foi que abaixou as tarifas de importação do Brasil tão rapidamente? Quem fez o Brasil entrar na Organização Mundial do Comércio com tão pouca margem de manobra para manter subsídios a exportação, diferentemente da Argentina, dos Estados Unidos e da França?

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