São Paulo, domingo, 24 de novembro de 1996
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Para Furtado, economistas 'se empavonaram'

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

Celso Furtado e Affonso Celso Pastore, dois dos entrevistados no livro "Conversas com Economistas Brasileiros", têm poucas coisas em comum, além do nome. Defensores de escolas econômicas muito diferentes entre si, estiveram em campos opostos boa parte das suas carreiras.
Apesar disso, Pastore não se furta em elogiar generosamente o livro "Formação Econômica do Brasil", escrito por Furtado em 1959.
"Aquele livro do Celso Furtado foi para mim uma coisa extraordinária. O que ele escreveu depois não teve o mesmo impacto. Foi o ponto alto da sua carreira. Foi um trabalho científico de grande repercussão, envergadura e importância", comenta Pastore.
Ele não é único. Uma das -raras- unanimidades do livro são os elogios ao clássico de Furtado. Quase todos os entrevistados o indicaram como uma das mais importantes obras brasileiras de economia. Mais do que isso, muitos dos entrevistados também citaram Furtado como um dos economistas de maior influência nas suas formações.
Ironicamente, Furtado nunca foi professor em universidade brasileira, só no exterior, nas universidades de Harvard, de Columbia, nos Estados Unidos, Cambridge, na Inglaterra, e Sorbonne, na França, durante os anos em que ficou exilado do país, depois do movimento militar de 64. Segundo Maria da Conceição Tavares, Celso Furtado "foi proibido, não chegou a dar aula porque nunca deixaram ele concorrer (a uma vaga de professor universitário)!".
Perguntado sobre isso, Furtado limitou-se a contar que "me candidatei a um concurso (na faculdade de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), mas enquanto fui candidato este não se realizou. Foi intriga menor, barata, típica do mundo acadêmico".
Contra o reducionismo
Os três entrevistadores contam que a conversa com Furtado, em outubro do ano passado, no seu apartamento em Copacabana, no Rio, foi uma das mais tranquilas. Aos 76 anos, Furtado tem enfrentado ultimamente problemas de saúde e reduziu suas atividades profissionais.
Primeiro presidente da Sudene (Superintendência Nacional do Nordeste), na década de 60, e ministro da Cultura do governo Sarney, Furtado deixou claro na entrevista que para ele é impossível tratar dos grandes temas nacionais ou internacionais apenas sob a ótica econômica.
"A economia está se desprestigiando de maneira incrível. Eu participo da Comissão das Nações Unidas sobre Cultura e Desenvolvimento e é impressionante ver como todos ficam horrorizados quando se quer reduzir os problemas a termos econômicos."
"Os problemas fundamentais da humanidade estão se complicando cada vez mais, como a destruição da natureza, o efeito estufa e a fome, que é o maior de todos. Não se vai resolver isso com os recursos da análise econômica. A impressão que se tem é que se espera demasiado dos economistas", afirma Celso Furtado, para complementar: os economistas "se empavonaram, imaginando que são importantes".
(CGF)

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