São Paulo, domingo, 24 de novembro de 1996
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Simonsen defende o Estado

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Hoje, eu tenho dúvidas se alguma coisa que produzi me agrada."
Num dos depoimentos mais diretos e sintéticos do livro "Conversas com Economistas Brasileiros", o ex-ministro da Fazenda Mário Henrique Simonsen, 61, afastado das suas atividades profissionais por razões de saúde desde fevereiro deste ano, permitiu-se alguns comentários pessoais. Ele falou bastante sobre sua passagem pelo governo e ofereceu uma avaliação basicamente positiva do Plano Real.
Simonsen acabou se encontrando com os autores do livro duas vezes, uma apenas para marcar a entrevista, que ele concedeu em outubro de 1995 no seu escritório na FGV (Fundação Getúlio Vargas), no Rio.
Doente (sofre de câncer no pulmão), Simonsen esteve várias vezes internado este ano e não tem escrito artigos ou dado entrevistas.
Os entrevistadores não acham que o tom lacônico que marca a conversa de Simonsen com eles tenha sido resultado da doença -"no dia da entrevista, ele estava bem disposto", diz Ciro Biderman. "Acho que ele é mesmo uma pessoa mais objetiva, que vai direto ao ponto central das questões."
Elegante nos comentários sobre seus colegas economistas, Simonsen não faz nenhuma crítica dura a eles, mas cita com desenvoltura sua amizade e relacionamento com alguns dos mais conhecidos economistas estrangeiros, como o americano Thomas Sargent, da Universidade de Chicago, várias vezes apontado como candidato a receber o Prêmio Nobel de Economia.
"No livro de Sargent ("Macro-economic Theory", de 1979), a matemática era péssima, era deselegante e cheia de erros, embora fosse um livro importante", conta Simonsen, confirmando que resolveu escrever um dos seus livros ("Dinâmica Macroeconômica") para "corrigir" os erros de Sargent. Sem modéstia, ele conta que "mostrei o meu livro para ele e disse: 'Olha, eu acho mais elegante fazer assim"'.
Um dos assuntos sobre o qual Simonsen mais falou foi o do papel do Estado e do mercado.
Durante sua gestão da política econômica, Simonsen, embora tenha sempre defendido o livre mercado, sancionou muitos projetos intervencionistas no mercado. Hoje, ele diz que "grau de intervenção depende do que o Estado é capaz de gerar nessa economia. Quando o Estado tinha uma capacidade de poupança substancial, justificava-se uma intervenção bem maior do que hoje, quando não tem capacidade de poupança nenhuma".
"O Estado é insubstituível como provedor de bens públicos, o suprimento da educação básica, suprimento de saúde básica, segurança e justiça, Forças Armadas etc. E o Estado tem que ter uma função regulamentadora da economia", explica Simonsen, que admite, no entanto, que o Estado pode e deve agir também em uma outra área, a de preços, embora em um segmento muito específico do mercado.
"Em um sistema livre de preços, deve-se apenas corrigir preços de monopólios ou nos casos em que haja suprimentos privados de bens públicos, que no fundo é um suprimento inadequado."
(CGF)

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