São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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Ministro novidadeiro

DARCY RIBEIRO

Paulo Renato já fez mais inovações no Ministério da Educação do que os dez ministros anteriores. É um homem de imaginação e de coragem que está varrendo as teias de aranha que entulham todo o sistema educacional brasileiro.
Ajudou muito a formular e a defender, no Senado, o meu projeto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, para fazer dela uma lei enxuta e modernizadora que dará liberdade aos sistemas estaduais de educação e às universidades para se renovarem. Agora estamos lutando para que a Câmara dos Deputados a aprove para nos dar, depois de oito anos de debates, a Lei Geral da Educação de que o Brasil necessita.
Inovação relevante do ministro foi implantar o sistema geral de avaliação das escolas de nível superior. Enfrentou a maior oposição, até da UNE. Mas afinal convenceu os estudantes e os professores de que era a primeira ação séria do Ministério para melhorar o ensino superior brasileiro, que anda péssimo. A maior parte de cerca de mil faculdades públicas e privadas, que atendem a um milhão e meio de alunos, funciona simulando que ensina e induzindo os alunos a simularem que aprendem. Isso é verdade, sobretudo, para as escolas privadas, que são principalmente casas de negócio, mas é verdade também para muitas das faculdades públicas.
Essa é uma questão gravíssima, porque nesse sistema escolar ruim é que se renova a massa de profissionais de todas as carreiras, que estão perdendo a qualificação. Médicos ruins, engenheiros ruins, advogados ruins puxam o Brasil para a decadência. A prova instituída pelo ministro não prejudica nenhum recém-graduado. Serve tão-só para avaliar a faculdade onde eles estudam, com o objetivo de forçá-las a melhorar.
Outra inovação do ministro Paulo Renato dirige-se ao ensino de 1º e 2º graus. Ambos péssimos. Mais da metade dos alunos do primário não completa o curso, evadindo antes de concluir a 4ª série. Isso significa que estamos produzindo mais analfabetos que alfabetizados, porque um aluno só se integra no mundo letrado quando já sabe bem ler, escrever e contar, habilidade que se alcança na 4ª série. O ensino secundário, reduzido a três séries, está desorientado, tanto pela ambição de ensinar tudo, quanto pela capacidade de ensinar aquilo que é indispensável para um jovem ir para a universidade ou ingressar na força de trabalho com possibilidade de êxito.
Nisso é que o ministro está entrando agora, com dois programas ambiciosíssimos. O primeiro é a ousadia de substituir o sistema vigente de cursos seriados por alguma forma de promoção continuada. Atualmente, o ensino de 1º grau concentra a maior parte dos alunos na 1ª série e continua retendo-os da forma mais estreita, porque a maioria precisa de mais de dez anos para completar o curso. Outra ousadia é desentulhar os currículos do ensino de 2º grau, tornando-os funcionais. Cada aluno aprenderá quanto for capaz, em três anos de curso, das disciplinas básicas e de tantas matérias complementares quanto cada escola seja capaz de ministrar eficazmente.
O que falta ao ministro é abrir os olhos para a única renovação educacional realmente importante, que é acabar com nossa louca invenção pedagógica que é o curso de turnos, passando progressivamente para cursos de tempo integral para professores e alunos. Isso é o que o mundo inteiro faz em sua escola de dia completo, em que o aluno participa das aulas e tem pelo menos uma hora de estudo dirigido. Só assim, a criança oriunda de família sem escolaridade prévia tem possibilidade de progredir.

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