São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
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Real valorizado põe em risco abertura, diz BNDES

Estudo da instituição defende desvalorização da moeda

DENISE CHRISPIM MARIN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Estudo de técnicos do BNDES, banco ligado ao Ministério do Planejamento, avalia que a abertura comercial corre riscos se o governo não promover a desvalorização do real em relação ao dólar.
A conclusão consta do "Texto para Discussão 49" do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), de outubro, que trata dos efeitos da abertura sobre a indústria.
"Para que não se coloquem o processo de abertura e o sucesso dos seus resultados em risco, é preciso que se volte a uma trajetória de desvalorização real da taxa de câmbio", diz o estudo.
A afirmação toca no ponto mais delicado da política econômica do governo. O Real baseou o controle da inflação na estratégia de sobrevalorizar a moeda nacional.
Isso representou uma trava -ou âncora, no economês- à alta dos preços internos, porque ficou possível importar barato.
O estudo do BNDES, porém, considera perigosa para o setor produtivo a combinação de abertura, promovida pelo Brasil nesta década, e defasagem cambial.
Os técnicos defendem correções, não mudanças de rumo na política econômica. Concordam que, antes de mudar o câmbio, são necessárias reformas que equilibrem as contas públicas, que seria uma outra forma de controle da inflação.
"Não deve haver maxidesvalorização do real. Mas teria que haver uma política de desvalorização mais rápida" diz o economista Maurício Moreira, gerente da área de planejamento do BNDES e funcionário da casa há quatro anos.
Ele é co-autor do estudo, com o economista Paulo Guilherme Correa, que acaba de deixar o banco.
Desempenho
Eles analisaram o desempenho -produção, margens de lucro, produtividade, exportações- e o avanço das importações de 45 segmentos industriais de 1989 a 1995.
O estudo argumenta que a literatura econômica e as experiências de países como o Chile e a Coréia do Sul não recomendam a liberalização do comércio acompanhado de defasagem cambial.
"Essa combinação traz consequências negativas para os setores produtivos, ao submetê-los a alto grau de concorrência. E pode provocar crise na balança de pagamentos do país", afirma Moreira.
Os cálculos dos economistas do BNDES mostram que, no final de 1995, a apreciação cambial acumulada era de 30,1%. Isso comparado com a média de 1989, quando o comércio no país ainda era fechado.
Nesse período, o país acelerou a redução das tarifas de importação. Em 90, a alíquota média era de 32,2%. Caiu para 13,9%, em dezembro de 95 e, em 2006, deverá cair mais dois pontos percentuais.
"Câmbio do Gustavinho"
O coeficiente de importação da indústria, que mede a participação dos produtos estrangeiros no consumo interno, aumentou de 4,6%, em 1989, para 15,5%, em 1995.
Em contrapartida, o coeficiente de abertura, que mede o volume de exportações sobre a produção total, avançou apenas quatro pontos percentuais no mesmo período -passou de 10,1% para 14,9%.
A tese do risco de se manter o câmbio valorizado é compartilhada pelo economista Luciano Coutinho, professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), autor de estudo sobre a competitividade da indústria nacional.
"O câmbio do Gustavinho (Gustavo Franco, diretor da área internacional do Banco Central) está destruindo a indústria nacional", diz Coutinho, que calcula a defasagem acumulada entre 30% e 40%.
Franco é o principal formulador da política cambial. Em estudo, ele ironiza o termo defasagem cambial e compara dólares e bananas.
Para Franco, não faz sentido falar em "defasagem bananal" se o preço da fruta começa a cair.
Como para a banana, o "preço" do dólar cai por excesso de oferta. A diferença é que o excesso é induzido pelo governo, que sobe os juros e atrai investidores externos.

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