São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Quadra espera por 'Karloff remendado'

MARTIN AMIS
ESPECIAL PARA A "THE NEW YORKER"

Cabeça: Muster. Pernas: Chang (já é um bom começo). Mãos: Stich. Axilas: Courier (ainda o número 1 entre os suadores). Tronco: Becker. Para garantir bons golpes, bastaria canibalizar os dois melhores americanos. Primeiro serviço, segundo serviço e smash: Sampras. Forehand, backhand e devolução de saque: Agassi. Finalmente, muito de Edberg nos voleios.
Este ano, em Wimbledon, eu suspeitei que Barão Bollettieri teria ido ao laboratório e alcançado a violência hulkiana com Mark Philippoussis. Era possível ver os parafusos se soltando do pescoço.
Mas o Barão se acalmou e produziu Richard Krajicek. "Isso" explicou a misteriosa ausência, nos estágios finais, de todos os grandes astros: caíram aos montes nas tábuas do Barão.
Krajicek, no entanto, não é o Monstro do Tênis. Não, Richard Krajicek não é esse jogador. Martin Amis é esse jogador. Eu sou esse jogador. Krajicek pode ser forte, mas eu sou mais -em pelo menos dois aspectos. Primeiro, a minha confiança ("tão" crucial no esporte) é de uma estirpe diferente. Krajicek estava surpreso ao vencer em Wimbledon! Quando chegar a minha vez, tomarei meu triunfo desanimadamente. Segundo, Krajicek vive se contundindo. Eu não.
Verdade, a quase imobilizadora dor nas costas que sofro é, provavelmente, resultado de jogar muito tênis. Ou algum tênis, que seja. E meus dois joelhos doem muito o tempo todo. Mas eu nunca me "contundo". Claro, eu já posso ouvir o cético Thomas, que logo me diria que é muito tarde para um tentativa séria ao posto de Nº 1. Até mesmo ao top ten. Nada tenho a declarar. Responderei na quadra.
Para adiantar, estou assumindo o problema de compilar minha inscrição no ATP Tour "Player Guide". Veja como está:
Data de nascimento: 25/08/49. Altura: 1,74 m. Peso: 68 kg. Batida: mão direita. Prêmios na carreira: um cruzeiro pelas Ilhas Britânicas. Perdas na carreira: umas 200 libras (em apostas).
Conquistas na carreira: 1989 - no Marrocos, tirou um game do instrutor do hotel, Kabir, que uma vez aqueceu com Yannick Noah; 1991 - bateu um sexagenário para alcançar a segunda rodada (melhor resultado da carreira) do torneio para jogadores de mais de 35 anos do Padington Sports Club; 1993 - Bateu Zach, David e Andy em domingos consecutivos no PSC; 1995 - em dupla com Peter Fleming, causou câimbras em um editor, ganhando o primeiro evento Pro-Am; 1996 - ganhou um set de Chris, fazendo ele quebrar duas raquetes novas. Bateu Ray no PSC.

Currículo no Grand Slam:
94 95 96
Austrália -- -- --
França -- -- --
Wimbledon -- -- --
EUA -- --

Os leitores notarão, no quadro acima, um intrigante vazio que sussurra "E o Aberto dos EUA em 96?". Ignorei a Olimpíada e não fui ao Aberto. Meu plano é me conservar para Wimbledon-97. Ainda há um ponto fraco em meu jogo -que estou decidido a eliminar.
Francamente, é a minha devolução de saque, que não é tão boa quanto a de Andre Agassi. Acho que nesse setor não sou tão melhor que Jimmy Connors. Um serviço é, por definição, uma jogada limitada, mas minha resposta tende a ser precipitada. Noto isso, particularmente, quando encaro jogadores altos -ou insuficientemente encolhidos pela idade. Assim, eu geralmente tendo a um tipo de resposta de saque "espirrada".
Mas só existe um serviço que realmente me preocupa. Não de Sampras. Porque Sampras tem apenas 1,83 m. Sei que ele pode pular mais alto que Air Jordan e não erra um smash há dez anos. Mas um lob preciso no palhaço, ou afundar minha devolução nos seus pés, deixaria Pete maluco. Becker pode esperar igual tratamento.
Em Wimbledon, eu provavelmente não serei pré-classificado e terei que enfrentar alguns jogadores bem razoáveis.
Já posso ver: crepúsculo a favor no dia de abertura, quadra 13, pouca luz. Alcançamos o inevitável tie-break do primeiro set. Observo atentamente por cima da rede e me concentro. Grama é o melhor piso de meu oponente, e ele está ensandecido. Goran Ivanisevic sacando "com bolas novas". Ele pode até abrir um ou dois pontos de vantagem. Mas seus nervos o farão falhar, como sempre. E minha confiança aumentará.
Não antevejo problemas até a quarta rodada, estágio no qual posso ser obrigado a quatro sets por alguém como Stich ou Kafelnikov. Então, Andre nas quartas; depois Pete ou Boris -qualquer um- nas semis. Nesse momento, Barão Bollettieri estará farejando ao meu redor. Estará atrás de meus grandes golpes: o lob e aquele pequeno toque de dispensar bola sobressalente em final de serviço. Ele estará na esperança de "remonstrualizar" Krajicek para a final. Bem, que o remendem como desejarem. Não quero um neo-Boris Becker para o nosso "rendezvous" na quadra central. Quero Boris Karloff. Não aceitaria outro.

Texto Anterior: Clubes negociam produzir suas camisinhas oficiais
Próximo Texto: Saiba quem é Martin Amis
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.